Retomada do comércio global exclui emergentes
Participação de países como o Brasil será limitada em novo ciclo mundial
Trocas norte-norte devem crescer; 'década de ouro' para países em desenvolvimento acabou, dizem analistas
RAQUEL LANDIM DE SÃO PAULO
Os
países emergentes vão se beneficiar menos da retomada do comércio
global no pós-crise. Essa é a avaliação de especialistas na área ouvidos
pela Folha.
Segundo
a OMC (Organização Mundial do Comércio), as trocas entre os países
devem crescer 4,5% neste ano --patamar razoável, mas abaixo da média dos
últimos anos.
A
retomada do comércio será puxada pelos países ricos, que começam a
emergir da crise, como Estados Unidos, Japão e, em menor escala, a
Europa. Os emergentes, como o Brasil, não estão bem posicionados para
aproveitar a nova tendência.
"A
expectativa é a de um maior comércio norte-norte e o Brasil não está
inserido na cadeias globais de produção", afirma Zeina Latif,
economista-chefe da XP Investimentos.
Para
a economista, a retomada lenta do comércio vai exigir que os países
"roubem" mercados para elevar as exportações. Para o Brasil, o cenário é
complicado, porque o país é pouco competitivo.
A
desvalorização do câmbio deve dar algum alento, mas a mão de obra hoje é
cara, a infraestrutura é ruim e o país não fechou tratados bilaterais
para reduzir barreiras a seus produtos.
"O
Brasil perdeu muito espaço e não está bem posicionado para aproveitar a
retomada da economia americana", diz Welber Barral, ex-secretário de
comércio exterior e sócio da Barral MJorge Consultores Associados.
Na
última década, a participação dos Estados Unidos nas exportações
brasileiras caiu de 22,8% em 2003 para 11% em 2013. Boa parte da mudança
se deve ao avanço chinês, mas também à perda de competitividade do
produto brasileiro nos EUA.
FIM DA DÉCADA DE OURO
Para
os analistas, chegou ao fim "a década de ouro" dos emergentes no
comércio global. Com a entrada da China na OMC em 2001 e seu enorme
apetite por commodities, a participação dos emergentes no comércio
disparou.
Segundo
o FMI (Fundo Monetário Internacional), a fatia dos emergentes no
comércio global saiu de 23,4% em 2000 para 39,9% em 2012 (último dado
disponível).
Esse
avanço se deve à expansão da China, que saiu de 3,7% para 10,7% do
comércio global no mesmo período. O Brasil ganhou pouco espaço, apesar
do aumento nas vendas de soja e minério para os chineses. Saiu de 0,9%
para 1,3% em 12 anos.
Esse
período de glória para os emergentes está terminando em meio a mudanças
significativas no ambiente econômico global. Dois fatores impactam
significativamente o Brasil.
O
primeiro são as mudanças da política monetária americana. O Fed (banco
central do país) começou a retirar os estímulos do mercado, provocando
crise nos mercados emergentes. "Temos pouca relação comercial com os
países mais afetados como a Turquia. O que mais preocupa é a Argentina",
diz Lia Valls, economista do instituto de economia da FGV.
O
segundo é a desaceleração da China, que segue crescendo com vigor
(7,5%), mas abandonou o patamar de dois dígitos dos anos anteriores.
Para analistas, isso significa demanda garantida por commodities, mas
sem a explosão de preços que beneficiou o Brasil nos últimos anos.
Para
Maurício Moreira Mesquita, principal assessor do departamento de
comércio do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento), é cedo para
declarar que os emergentes estão fora do jogo do comércio.
No
médio e longo prazo, a tendência é que China e Índia continuem
comprando matérias-primas, garantindo o avanço de países como o Brasil.
"Os países asiáticos estão longe de começarem a demandar serviços", diz.
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