quarta-feira, 26 de março de 2014

OCULTAÇÃO DE CADÁVER & VÍTIMAS DA DITADURA: coronel reformado Paulo Magalhães, intimados a depor na comissão da verdade.

                     Noticia
PF intima coronel a falar sobre ocultação de corpos na ditadura
DO RIO DE JANEIRO
22/03/2014 03h10
A Polícia Federal intimou ontem o coronel reformado Paulo Malhães, 76, a prestar depoimento à Comissão Nacional da Verdade sobre a ocultação dos restos mortais de vítimas da ditadura.
O oficial, que diz ter dado uma "solução final" à ossada do ex-deputado Rubens Paiva, agora afirma que corpos de vítimas da Casa da Morte de Petrópolis (RJ) tinham os corpos mutilados e jogados em um rio.
A casa foi mantida clandestinamente pelo Exército como local de tortura e morte de um número estimado em até 24 presos políticos.
Em depoimento à Comissão da Verdade do Rio, reproduzido ontem pelo jornal "O Globo", Malhães disse que os corpos tinham as barrigas cortadas e eram arremessados em sacos com pedras, para que não flutuassem.

Juliana Dal Piva - 07.dez.2012/Folhapress

Manifestantes em frente à Casa da Morte de Petrópolis, na região serrana do Rio
Manifestantes em frente à Casa da Morte de Petrópolis, na região serrana do Rio
Antes disso, os militares arrancavam as arcadas dentárias e os dedos das mãos para evitar que as vítimas fossem identificadas, de acordo com o relato do coronel.
"Jamais se enterra um cara que você matou. Se matar um cara, não enterro. Há outra solução para mandar ele embora. Se jogar no rio, por exemplo, corre", disse.
"Como ali, saindo de Petrópolis, onde tem uma porção de pontes, perto de Itaipava. Não com muita pedra. O peso [do saco] tem que ser proporcional ao peso do adversário, para que ele não afunde, nem suba", afirmou.
Malhães descreveu a técnica para ocultar corpos como um "estudo de anatomia". "Todo mundo que mergulha na água, fica na água, quando morre tende a subir. Incha e enche de gás", disse.
"Então, de qualquer maneira, você tem que abrir a barriga, quer queira, quer não. É o primeiro princípio. Depois, o resto, é mais fácil. Vai inteiro. Eu gosto de decapitar, mas é bandido aqui", disse, referindo-se à Baixada Fluminense, onde mora.
LOCALOZAÇÃO
O coronel disse duvidar que os restos mortais das vítimas sejam encontrados. "Não acredito que, em sã consciência, alguém ainda pense em achar um corpo", afirmou.
Ele acrescentou que a cúpula do Ministério do Exército tinha conhecimento do que acontecia em Petrópolis.
Nos anos 90, o ex-sargento Marival Chaves, que também atuou na região serrana do Rio, deu outra versão. Ele disse que os corpos de vítimas da Casa da Morte eram esquartejados e enterrados aos pedaços.
O coronel reformado Paulo Malhães deverá ser ouvido na próxima terça pela Comissão Nacional da Verdade.
O coordenador do órgão, Pedro Dallari, disse que seu relato mostra que o desaparecimento de presos foi uma política de Estado na ditadura militar.
"É uma barbárie. Não tenho a menor dúvida de que esses atos aconteciam com o conhecimento e o aval da cúpula do regime", disse.
Ainda segundo Dallari, "isso afasta a versão, sempre repetida por militares, de que as violações de direitos humanos decorriam de excessos de alguns agentes".
Esses homens agiam com respaldo institucional", afirmou o coordenador.
O CASO RUBENS PAIVA
QUEM ERA Nascido em 1929, Rubens Beyrodt Paiva era engenheiro. Foi eleito deputado em 1962. Após o golpe, foi cassado e se exilou na Europa. Em 1965, voltou ao Brasil e mudou-se para o Rio, de onde manteve contato com exilados
A PRISÃO Em 20 de janeiro de 1971, duas mulheres foram presas com cartas de exilados que seriam entregues a Paiva. Ele foi preso à tarde, em casa, por agentes da Aeronáutica e levado a quartel no aeroporto Santos Dumont. À noite, foi levado ao DOI-Codi, na Tijuca
A MORTE Segundo a Comissão da Verdade, ele foi morto após sessões de tortura no DOI-Codi. Exército sustenta que ele não morreu no local

Reprodução

O deputado Rubens Paiva durante CPI na Câmara, em 1963
O deputado Rubens Paiva durante CPI na Câmara, em 1963
 
 
 
 
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Minha História
Minha história: Capitão que deixou Exército para entrar na luta armada lembra de atritos com Dilma
DEPOIMENTO A...
CRISTINA CAMARGO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM BAURU
22/03/2014 03h15
 
Assaltos, treinamento de guerrilha e a morte de um inocente são parte da vida de Darcy Rodrigues, 72. O capitão do Exército deixou a instituição em 1969 e entrou na luta armada. Lembra de "duras discussões" com Dilma Rousseff. Mais de 40 anos após matar um taxista durante um assalto no Rio, diz ainda sentir o "peso" do crime.
Eu morava em Três Corações (MG), sem perspectiva de trabalho. Fiz concurso para escola militar e passei. Pensava, com aquele idealismo juvenil, em contribuir para a formação de uma sociedade mais avançada.
Jânio Quadros [ex-presidente] renunciou e houve a tentativa de golpe contra a posse de João Goulart [em 1961]. Comecei a sentir a conspiração dentro do Exército. Em 1962, fui para um regimento em Quitaúna [SP]. O [Carlos] Lamarca era oficial e me procurou. Eu articulava os sargentos, e ele, os oficiais.
Depois do golpe, o Lamarca disse: tenho contato com [o guerrilheiro Carlos] Marighella. Falei: tenho com o MNR [origem da VPR, organização de luta armada]. Marcamos dia e hora para sair do quartel [com armas e munição]. Minha mulher, minha filha, a mulher do Lamarca e os filhos foram para Cuba.

João Rosan - 29.ago.2013/Jornal da Cidade de Bauru

Capitão Darcy Rodrgues mostra DVD sobre 1964 em Bauru (SP); ele participou da resistência à ditadura
Capitão Darcy Rodrigues mostra DVD sobre 1964 em Bauru (SP); ele participou da resistência à ditadura
Entrei na clandestinidade após me despedir da família. Fui com o Lamarca para um aparelho [esconderijo] em janeiro de 1969. Começaram as prisões, crises. A ideia era ir direto para a zona rural, mas começou a demorar.
Disse ao Onofre Pinto, líder da VPR: quero participar de ações na cidade. Fizemos uma ação num banco na rua Piratininga, em São Paulo, que foi um desastre. Saiu tiroteio, morreu um guarda, um caos. O cara veio atirar em mim, e o Lamarca fez o papel dele [ao matar o segurança].
Participei de todas as ações da VPR naquele período. Começou uma discussão com o Colina [outra organização da luta armada] para uma fusão com a VPR.
A Dilma era meu contato no Colina. Tivemos discussões duras. A ala militar queria formar um Exército popular, por meio de guerrilha. A Dilma queria fortalecer o trabalho urbano, incentivar uma greve geral, tentar uma situação política por meio da luta de massas. Hoje a história mostra que ela estava certa.
Dilma era e é uma pessoa dura. Cai na asneira de chamá-la de sargentona quando era ministra -disseram que ela não gostou. Quando ela veio a Bauru [na campanha de 2010], fui ao aeroporto encontrá-la. Ela colocou a mão no meu ombro e falou: você está velho, acabado. Eu disse: vim aqui só para pegar o telefone de seus cirurgiões plásticos e esteticistas, para ficar bonito igual a você.
No Rio, a organização fez um [assalto a] banco e foi um desastre. Tinha um motorista de táxi que era militar, pegou um policial e saiu perseguindo o carro da ação.
Vi que dois companheiros seriam presos. Foi traumatizante, tive que atirar. Morreu o taxista [Cidelino do Nascimento]. Isso pesa muito, mas não tive alternativa.
Teve o roubo do cofre do Adhemar de Barros [ex-governador de São Paulo]. Foi chamado de grande ação, mas não funcionou direito. Na hora o cofre saiu da prancha colocada para deslizar e caiu. Tivemos que pegar na unha. Foi uma alegria, aquele monte de dólares.
Fui preso em abril de 1970, no Vale do Ribeira. Fui torturado ali mesmo. Depois, três vezes ao dia. Trocado pelo embaixador alemão, fui para a Argélia e depois Cuba, onde fiquei 10 anos.
Fui professor e estudei economia em Havana. Dois dos meus filhos nasceram lá. Voltei ao Brasil em 1980, depois da anistia. Era como se tivesse saído no dia anterior. Isso aqui é um país maravilhoso.
Em Bauru, policiais me seguiam na rua. Uma vez saí de um escritório e vi um cara atrás de mim. Corri, parti para cima. Ele disse: só estou cumprindo ordens. Depois virou amigo.
Lembro de uma frase do Lamarca: morrer é fácil, difícil é carregar os fantasmas dos que se foram.
 
 

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