VATICANO-CÊNTRICA & DEFEITO DA CÚRIA ROMANA
Jornal do Terra
Papa diz que defeito da Cúria é se ocupar somente do Vaticano
O
papa Francisco assegurou que o defeito da Cúria romana, o governo da
Igreja, é que a mesma se ocupa apenas dos problemas da Santa Sé, se
esquecendo do mundo que a cerca, em uma entrevista publicada nesta
terça-feira pelo jornal italiano La Repubblica.
A
Cúria "tem um defeito: é Vaticano-Cêntrica. Vê e se ocupa dos
interesses do Vaticano e esquece o mundo que a rodeia. Não compartilho
com essa visão e farei de tudo para mudá-la", explicou o papa na
entrevista ao fundador do jornal, Eugenio Scalfari.
A
entrevista foi publicada hoje, coincidindo com a primeira reunião do
papa com o chamado G8 da Igreja, o Conselho de oito cardeais nomeados
por Francisco para analisar a possível reforma da Cúria romana.
"A
Igreja tem que voltar a ser uma comunidade do povo de Deus e os
presbíteros, os párocos e os bispos devem estar a serviço do povo de
Deus", acrescentou o pontífice.
Para
o bispo de Roma, no passado "os chefes da Igreja foram frequentemente
narcisistas, bajulados por seus cortesãos" e acrescentou que "a Corte é a
lepra do Pontificado".
Sobre
sua visão da Igreja, explicou que esta não se deve basear no
"proselitismo", mas "em escutar as necessidades, as desilusões, o
desespero e em dar esperança aos jovens e ajudar os velhos, se abrir
para o futuro e divulgar o amor. Ser pobre entre os pobres".
Francisco
afirmou na entrevista de três páginas que no Concílio Vaticano II foi
decidido "que deve se olhar para o futuro com um espírito moderno e se
abrir à cultura moderna, o que significava o ecumenismo religioso e o
diálogo com os não crentes".
Mas
o pontífice reconheceu que "até agora pouco foi feito" e anunciou que
ele tem "a humildade e a ambição" de tomar as rédeas do caminho da
Igreja rumo à modernidade.
Em relação às mudanças que ele deverá fazer, lembrou como nomeou o Conselho dos oito cardeais para que o aconselhem.
"Não
são cortesãos, mas pessoas sábias, encorajadas pelos meus próprios
sentimentos. Isto é o início de uma Igreja com uma organização não só
vertical, mas também horizontal", destacou.
Durante
a conversa com Scalfari, Francisco brincou ao assegurar que quando tem
diante de si um "clerical", também ele se torna "anticlerical" e é que,
explicou, "o clericalismo nada tem a ver com o cristianismo. São Paulo
foi o primeiro que falou com os pagãos, os crentes de outras religiões".
Por
outra parte, declarou que a Igreja "não se ocupará da política", pois
"as instituições políticas são laicas por definição e atuam em esferas
diferentes".
"A Igreja não irá além de seu dever de expressar e divulgar seus valores, pelo menos enquanto eu estiver aqui", confirmou.
Na
entrevista também foram abordados assuntos da atualidade e o pontífice
considerou que "os grandes males do mundo são o desemprego dos jovens e a
solidão dos idosos".
"Os idosos necessitam de cuidados e companhia. Os jovens de trabalho e esperança", indicou.
O
papa também criticou o "liberalismo selvagem" que faz com que "os
fortes se tornem mais fortes, os fracos mais fracos e os excluídos mais
excluídos", e acrescentou que "são necessárias regras de comportamento e
também a intervenção do Estado para corrigir as desigualdades mais
intoleráveis".
Na
entrevista, o papa fala dos santos de sua experiência religiosa e,
apesar de ter matizado que não pode fazer uma classificação de seus
preferidos "como se fossem jogadores argentinos", os "mais próximos de
sua alma" são Francisco de Assis e Santo Agostinho.
Sobre
a "vocação mística" de alguns santos, Francisco explicou que não
acredita que tenha esta vocação, mas revelou como, após ter sido eleito
papa e enquanto esperava antes de subir até a sacada da Basílica de São
Pedro, fechou os olhos e deixou de sentir "a ansiedade e a emoção".
"Uma
grande luz me invadiu, durou só um instante, mas me pareceu muitíssimo
tempo. Depois a luz se dissipou, eu me levantei do golpe e me dirigi à
mesa onde estavam os cardeais para assinar o ato de aceitação", relatou.
O
papa termina a entrevista com Scalfari prometendo um novo diálogo com o
jornalista, que se define como ateu, na qual abordarão assuntos como o
papel da mulher na Igreja.
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