Assange a RT: ‘EUA havia perdido a América Latina de vista por estar ocupado no Oriente Próximo’
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Julian
Assange, o criador de WikiLeaks, concedeu uma entrevista exclusiva a
Eva Golinger, apresentadora do programa de RT ‘Detrás de la Noticia’,
onde deu sua opinião sobre a espionagem global dos EUA
11 outubro 2013
Tradução: ADITAL
Versão completa da entrevista exclusiva de Eva Golinger a Julian Assange, em 'Detrás de la Noticia'
EVA GOLINGER: Bem
vindos a ‘Detrás de la Noticia’, em RT. Aqui estamos com um programa
muito especial. Nos encontramos na embaixada do Equador em Londres. Está
conozco o fundador de Wikileaks, Julian Assange.
JULIAN ASSANGE: De nada.
GOLINGER: Muito
obrigada, senhor Assange por estar conosco em "Detrás de la Noticia”.
Em primeiro lugar, temas como ciberguerra, espionagem, monitoramento de
informação… O senhor tem escrito bastante sobre esses temas e também a
organização Wikileaks expôs o uso desses mecanismos por parte do governo
dos EUA e seus aliados para avançar mais seu poder e influência no
mundo. Como o senhor percebe as revelações e documentos publicados
através de Edward Snowden, ex-contratista da Agência Nacional de
Segurança dos Estados Unidos, que causaram uma reação furiosa na América
Latina, devido o que revelaram sobre a espionagem massiva dos EUA e
também, especificamente, a chefes de Estado de países como o Brasil, o
México, a Venezuela e a Bolívia, o que foi sua forte condenação às
reações desses governos na América Latina frente a essas informações?
ASSANGE:
98% das telecomunicações da América Latina para o restante do mundo,
contando mensagens de texto, chamadas telefônicas, correios eletrônicos
etc. passa através dos EUA. Em virtude da geografia da América e como
resultado desta, as agências dos EUA têm a vantagem de ser o centro
neurálgico através do qual podem interferir com facilidade nas
comunicações que passam através deles; catalogá-las e guardar certos
dados para sempre e, assim, obter informação de como a América Latina se
comporta, para onde se move, quais as transferências econômicas, as
atividades dos líderes e de atores chave.
De
alguma maneira, isso permite aos EUA prever o comportamento dos líderes
e interesses latino-americanos e também chantagear a quase qualquer
pessoa importante. Na América Latina, quase todo mundo pode ser
chantageado pelos EUA, porque tem acesso aos seus arquivos de
telecomunicações que passam por lá, da mesma forma que outros dados
obtidos na América Latina, mediante a instalação de "escutas” na fibra
ótica ou nos equipamentos de vigilância em embaixadas e agências de
desenvolvimento. Como as que foram descobertas no Equador, como
resultado das filtrações realizadas por E. Snowden. Então, existe uma
situação na qual os EUA traçaram o mapa da estrutura da comunidade
inteira, as relações entre os indivíduos que têm oportunidade de exercer
alguma influência na América Latina e pode produzir mudanças e fazer
com que distintos atores se enfrentem.
Se
isso é verdade, então, por que Maduro ganhou as eleições na Venezuela?;
por que o presidente Correa ganhou com uma significativa maioria as
eleições no Equador, dada a atitude dos EUA para com os Estados. Não é
porque os EUA não contem com suficientes dados de inteligência sobre a
América Latina. É a consequência de que os Estados Unidos tiraram seus
olhos da América Latina por uns 10 anos e os colocaram no Oriente Médio,
e, em certa medida, sobre a Ásia. Nesse período, vários países
latino-americanos desenvolveram e fizeram crescer sua independência dos
interesses dos EUA. E agora, infelizmente, os EUA estão voltando a
interessar-se na América Latina. E, diferente de 10 anos atrás, agora,
eles têm um massivo aparelho de vigilância mundial, para controlar cada
indivíduo.
GOLINGER: A
presidenta do Brasil Dilma Rousseff, em um discurso ante a Assembleia
Geral das nações Unidas, condenou fortemente esse programa de espionagem
massivo de Washington e também fez uma proposta de criar uma plataforma
internacional de Internet livre do controle dos EUA. Essa proposta foi
respaldada por outros países da América Latina. É possível a soberania
tecnológica nesse sentido, fora do controle dos EUA e é algo que
realmente poderia solucionar essa situação da invasão e da violação da
soberania?
ASSANGE:
Assim como a soberania não tem significado sem liberdade de movimento,
não existe uma soberania significativa sem independência econômica e não
existe soberania se ainda não há controle de suas próprias
comunicações. É a liberdade de movimentos, a liberdade de comunicações e
a liberdade de interação econômica que define um Estado. EUA tentaram
agressivamente impedir o intercâmbio econômico através da intervenção e o
controle de Swift, Visa, MasterCard ou do dinheiro enviado para a
América Latina mediante o Bank of America e, inclusive, entrando aos
principais sistemas de computação da região que operam importantes
segmentos do governo e dos meios; a Petrobras, no Brasil; e outros
importantes interesses econômicos; e interferindo na soberania das
comunicações. A questão é essa! Seja uma pessoa ou uma organização que
façam parte de um Estado ou outro, ou de uma parte do Estado, podem
controlar seus movimentos, seus intercâmbios econômicos ou seus
intercâmbios em telecomunicações. EUA está se apropriando da interação
econômica e da interação em telecomunicações e o que resta é um certo
controle do força física nesse Estado.
Isso
também tem acontecido em outros países, como fez EUA ao estender a
petição de extradição. O próprio fiscal de Segurança Nacional está me
processando com base nisso. A petição de extradição foi divulgada na
Venezuela, na Bolívia, em Hong Kong, na Islândia e na Irlanda. Isso tudo
aproveitando-se das disposições dos tratados que forçavam a polícia e
os sistemas judiciais de outros países a obedecer aos interesses do
governos dos EUA.
Assim,
ao subordinar os sistemas políticos legislativos e as disposições dos
tratados a outro governo é uma maneira de controlar todas essas forças. E
a teoria acadêmica do que está acontecendo aqui é chamada de "lei
justa”, que significa usar as disposições internacionais dos acordos e
das organizações multilaterais para conseguir as conquistas territoriais
que normalmente são conseguidas mediante guerras em vez de fazê-lo
mediante a lei. Então, quando vinculadas essas atividades às
telecomunicações, os responsáveis das políticas devem estar advertidos
na América Latina. Não há uma soberania efetiva sem a soberania dos
elementos necessários: interação econômica, telecomunicações e
instrumentos de controle policiais e judiciais.
Essa
é a ideia proposta por Dilma de estabelecer uma comissão reguladora
internacional para a Internet. Isso provocou o terror da União
Internacional de Telecomunicações (UIT), que têm o controle dos aspectos
chave da regulação, já que a UIT tem sido dominada pela Europa durante
muitos anos. Não creio que a Internet deva ser dominada por nenhuma
região e, consequentemente, não deve ser dominada por governos, pois tem
dado espaço para uma grande liberdade de comunicação entre os
indivíduos e do comércio e negócios devido à falta de controle dos
Estados
Algumas
das propostas feitas não são um mecanismo para dar aos brasileiros uma
maior liberdade de intercepção; são um mecanismo para dar ao governo
brasileiro igual acesso a interceptar a informação. Deve-se ter muito
cuidado. É uma tendência natural dos Estados, claro, querer aumentar seu
poder e estão mais interessados em aumentar o poder nacional do que
preocupados porque EUA podem aumentar seu poder.
GOLINGER: O
senhor escreveu e criticou bastante sobre o Google, um serviço muito
comum utilizado em todo o mundo. O senhor acusou a Google de ser uma
extensão da política exterior dos EUA. Muitos chefes de Estado na
América Latina, altos funcionários, uma grande parte da cidadania têm
contas no Gmail. Por que considera que o Google significa tanto perigo
para nossa sociedade? Quais são as alternativas?
ASSANGE:
Escrevi sobre isso no meu livro ‘Cypherpunks’ e em alguns Artigos
recentes que reviam o livro do Diretor Executivo do Google, ‘The New
Digital Age’. Nesse livro está muito claro o que está acontecendo.
Google apresenta Washington como um visionário geopolítico que pode
mostrar o caminho a ser seguido na América Latina, na Ásia ou na Europa.
É um trabalho bastante reacionário com o respaldo prévio de Henry
Kissinger, Madeleine Albright, Tony Blair, Michael Hayden, ex-diretor da
CIA e da NSA, o reconhecimento principal é para Kissinger. Então, de
onde vem isso?
Isso
vem do Google, que nasceu na Califórnia, como uma grande parte da
cultura estudantil, na Universidade Stanford e foi uma iniciativa muito
boa para desenvolver serviços que o mundo possa usar. Porém, como o
Google é grande, o governo também ficou envolvido. Ao pretender sair ao
mercado internacional, tiveram que relacionar-se com o Departamento de
Estado até o ponto do chefe de ‘Google Ideas’ ser o ex-conselheiro de
Hillary Clinton, saindo do Departamento de Estado.
Esses
estreitos laços entre os chefes do Google e o Departamento de Estado
estão documentados em WikiLeaks. As publicações sobre Stratford contêm
cabos que provam vínculos entre as figuras chave do Departamento de
Estado e o Google. Isso não nos surpreendeu reconhecer que já em 2009 o
Google se meteu com a NSA para participar no programa de prisões.
Podemos dizer que agora Google é parte da família estadunidense. Agora,
gasta mais dinheiro em gestões em Washington do que Lockheed Martin. No
Livro Google destaca-se que o que Lockheed era para o século XX, para o
século XXI serão as companhias de alta tecnologia. De fato, isso é uma
forma bastante forte de neoimperialismo. Quero evitar banalidades;
porém, disso se trata: dar a todo o mundo com o sistema econômico e de
informação dos EUA.
GOLINGER: Agora,
vamos falar um pouco sobre Wikileaks, organização que o senhor fundou.
Já publicou centenas de milhares de documentos classificados de agências
dos EUA, entre outras potências, e teve um impacto significativo em
âmbito mundial. Foi atingida pelo forte ataque por parte do governo dos
EUA. Mas, continuam publicando documentos. Como continuam funcionando
sob esses ataques se estes continuam, e quais são os planos de WikiLeaks
para o futuro?
ASSANGE: Os
ataques continuam. Tudo isso começou em 2010. O Pentágono deu uma
conferência de imprensa de 40 minutos. Durante esse evento, essa
organização nos demandou como instituição e também a mim, pessoalmente
para que destruíssemos todos os nossos materiais publicados em relação
ao governo dos EUA e também tudo o que pensamos publicar no futuro e que
deixássemos de colaborar com os delatores do exército estadunidense, do
contrário, nos obrigariam a fazê-lo. Nós respondemos que não. Somos
editores e prometemos a nossas fontes e ao nosso público publicar
materiais com toda a transparência. O governo dos EUA tem estado
envolvido em uma longa guerra contra WikiLeaks, que ainda continua.
Isso
começou com uma investigação de todo o governo, incluindo as 12
diferentes agências estadunidenses, entre elas a CIA. Foi publicamente
declarada como o Grande Julgamento contra WikiLeaks, uma investigação
que continuará até o dia 23 de agosto. A situação na qual estamos é que a
suposta fonte importante de WikiLeaks, Bradley Manning, foi sentenciado
a 35 anos. É uma vitória tática, creia-se ou não, de sua equipe de
defesa, porque o governo dos EUA exigia para ele uma cadeia perpétua,
sem liberdade condicional. Provavelmente, como resultado da intervenção
do caso de E. Snowden, e sabemos que é uma realidade, o sentimento em
Washington em relação à WikiLeaks é cada vez mais adverso. Porém, nossa
organização continua fazendo publicações; continua lutando nos
tribunais, onde intervimos muitas vezes.
No
caso de Bradley Manning, tivemos uma série de julgamentos vitoriosos
contra o bloqueio bancário. É interessante o fato de que todos os
julgamentos nos quais WikiLeaks foi envolvido, houve vitórias
significativas no Parlamento Europeu, onde conseguimos impulsionar a
legislação destinada a parar o bloqueio bancário. Esse bloqueio é
similar ao que estão fazendo com Cuba. Em relação aos bloqueios
financeiros e à liberdade da interação econômica é o direito soberano de
cada Estado. Refiro-me ao direito de cada Estado à interação econômica.
A Internet significa a fusão da interação econômica e a comunicação.
Quando os EUA querem interceptar ou supervisionar a interação econômica
entre as empresas e as pessoas, faz com que a Internet pare. Isso piora
cada vez mais. Se você quer bloquear o intercâmbio econômico de um
banco, tem que bloquear suas telecomunicações.
GOLLINGER:
O senhor mencionou o caso do soldado Manning, Chelsea Manning, como
agora é conhecida, e condenada a mais de 35 anos de prisão por
espionagem; porém, a acusação e a sentença foram baseadas nesse cargo de
espionagem por ter dado documentos classificados a um meio de
comunicação. O que significa isso para o jornalismo, para meios de
comunicação se são tratados como inimigos? Por que foi aplicada a Lei de
Espionagem? Ao ser tratados como inimigos, será que isso não põe em
risco o jornalismo? E que significa isso para o trabalho de denunciantes
e de jornalistas? Isso faz parte da excepcionalidade tão defendida pelo
presidente Barack Obama, em um discurso recente na 68ª Assembleia da
ONU?
ASSANGE:
Veja, quando um presidente fala sobre excepcionalidade, o que está
tentando dizer? Trata-se de que não se aplicam as regras do
comportamento civilizado, tanto em caso de invadir outro país, quanto
abusar da lei em seu próprio território. Sobre a forma pela qual Barack
Obama usa a lei de espionagem contra os supostos informantes dos
jornalistas e contra os jornalistas é algo novo. É muito importante que
as pessoas entendam que não se trata de um pequeno desvio, mas de uma
mudança radical. Barack Obama processou mais pessoas segundo a Ata de
Espionagem, mais informantes dos jornalistas do que todos os presidentes
anteriores juntos desde 1917. De fato, ele processou o dobro. É uma
decisão consciente e deliberada da Casa Branca para criar um efeito
intimidatório com a ajuda da Ata de Espionagem como contrapeso para
alguns outros mecanismos. No caso de Bradley Mannig, não há alegação e
nunca existiu alegação de que ele tivesse passado informação para outro
país; de que tivesse vendido informação; de que tivesse intenção de
causar danos aos EUA ou a seu povo de alguma maneira. É um abuso
linguístico chamar espionagem à ação de falar com os meios. É um abuso
similar dizer que WikiLeaks, sendo um portal de publicações, dedica-se à
espionagem.
GOLINGER:
Agora, quero falar sobre seu caso. Estamos aqui na Embaixada do
Equador, em Londres, onde o senhor está há mais de um ano, quase um ano e
meio. Recebeu asilo político e diplomático do Equador; porém, não pode
viajar para o Equador porque se sair por essa porta, as autoridades
britânicas podem prendê-lo. Recentemente, o Chanceler do Equador,
Ricardo Patinho, afirmou que estão trabalhando muito para negociar uma
solução com o governo britânico; porém, até o momento, sem êxito.
Afirmou que poderiam levar o caso a um tribunal internacional: violação
da soberania, do direito ao asilo. Como o senhor vê que essa situação
pode ser resolvida?
ASSANGE:
É uma mistura política, diplomática e legal. Creio que em um prazo
razoavelmente curto, um ano e meio, de fato, há alguns sinais positivos
de que haveria uma resolução. O tempo está a meu favor nessa situação.
Em parte, porque à medida que o tempo passa, surgem mais dados sobre a
situação. Apresentamos demandas criminais na Suécia, na Alemanha, em
relação à atividade de inteligência contra a organização. Por isso,
creio que a posição de alguns dos figurantes envolvidos torna-se cada
vez mais inalcançável com o passar do tempo. Vimos, por exemplo, até ao
lorde conservador, o prefeito de Londres, Boris Johnson, denunciar o
gasto na polícia que me espia fora dessa embaixada e dizer que o
dinheiro que agora supera dez milhões de dólares deveria ser gasto na
polícia de elite, no trabalho policial próprio, em vez de custodiar essa
Embaixada.
GOLINGER:
O senhor e Edward Snowden receberam asilo. No Equador, em seu caso; no
caso de Snowden, ofertas de asilo na Venezuela, na Bolívia, também na
Nicarágua. Ele recebeu asilo temporário na Rússia, para onde o senhor,
através de WikiLeaks, o ajudaram a chegar. Considerando que países
latino-americanos, tradicionalmente têm menos poder e são consideradas
nações em desenvolvimento, qual sua opinião sobre a valentia dos países
latino-americanos ao desafiar o poder dos EUA, apoiando os senhores?
ASSANGE: Bom,
é extremamente interessante, certo? Estivemos envolvidos na petição de
asilo de Edward Snowden, formal e informalmente ao redor de 20
diferentes nações. Alguns porque pensamos que era uma oportunidade
digna; outros, porque queríamos mostrar ao público a negativa e gerar um
certo debate público e que houvesse testemunhas de como o governo
estava se comportando. Porém, você tem razão: em relação a essas nações
que deram um passo, foram a América Latina e a Rússia, não toda a
América Latina tampouco; mas a Venezuela, a Bolívia e o Equador
mostraram interesse. O que isso significa? Não são países muito
poderosos. No caso da Rússia, podemos entender, já que tem suas próprias
armas nucleares; é geograficamente independente... Mas, a América
latina, não. Portanto, creio que é realmente uma expressão da democracia
latino-americana, onde há governos que sentem a necessidade de ser
responsáveis com seu povo; que necessitam expressar os valores que
perseguem ou os valores que a população necessita. Vejo que é uma parte
da natureza democrática da Venezuela, do Equador. Talvez o Brasil não
fez ainda uma oferta porque está começando a responder a outras
questões... E protegendo a ecologia, começando a responder à pressão
pública.
Pode-se
comparar de uma forma interessante a Alemanha e a Venezuela, pois na
Alemanha, a privacidade é realmente uma grande preocupação;
provavelmente, sobretudo, dos países médios. A privacidade é o que mais
se valoriza na Alemanha devido ao que aconteceu na II Guerra Mundial e
por outros aspectos culturais. E na Alemanha temos Angela Merkel; eles
não necessitam envolver-se nesses acontecimentos sobre o asilo de
Snowden, sobre espionagem no contexto dos interesses e privacidade do
país, de um país que tem eleições federais, nem há publicações de
documentos alemães. Não, o governo alemão não ofereceu asilo a Snowden e
nem nada parecido. Esse é um exemplo que, inclusive, se a população tem
um desejo democrático, é somente o desejo do povo. Um exemplo de que o
governo não reflete bem o desejo da população. Podemos ver no Equador,
na Venezuela e na Bolívia que o governo é mais receptivo, pelo menos em
relação aos assuntos de soberania, às demandas da população.
GOLINGER:
Agora, quero fazer uma última pergunta com vários temas. Um é o tema do
jornalismo, jornalismo investigativo. Se jornalistas, denunciantes, os
que publicam informação sobre os abusos do poder cometidos pelo governo
dos EUA e outras potências com bastante poder, são tratados como
terroristas ou inimigos do Estado, o jornalismo investigativo está em
perigo de extinção? Referindo-nos ao caso de Snowden como denunciante e a
perseguição contra ele: o que isso significa para quem, no futuro,
denunciar abusos no poder? Como vê a resolução do caso Snowden? E uma
última parte dessa pergunta é o novo filme que está sendo divulgado
sobre WikiLeaks, sobre sua pessoa, "O quinto poder”, um filme feito em
Hollywood, que o senhor já criticou como uma medida de propaganda para
distorcer ou manipular o trabalho que vocês têm feito. Isso tudo faz
parte da campanha para desacreditar o trabalho de WikiLeaks, que
denuncia os abusos cometidos, particularmente, pelo governo dos EUA?
ASSANGE:
Edward Snowden está a salvo na Rússia. Tem asilo para um período de um
ano formalmente; porém, imagino que os russos estão dispostos a
estendê-lo indefinidamente. Me preocupa o acosso jornalístico no qual
ele esteve envolvido junto com nossa jornalista Sara Harrison, que
esteve envolvida no caso Snowden e passou 39 dias com ele no aeroporto
de Moscou após o voo desde Hong Kong. Ela o protegeu e ajudou com a
apresentação das solicitações. Ela permanece na Rússia; ela é do Reino
Unido. Como bem sabemos, o jornal The Guardian se considera como
associado de Glenn Greenwald, que foi detido no aeroporto de Londres por
atos de terrorismo, sem acusação formal. Foi iniciada uma investigação
formal acerca de todas essas pessoas, uma investigação formal do caso
terrorista.
A
postura do Reino Unido é clara. Enquanto encontrem alguém que lhes
indique o que devem fazer com esse assunto, o farão. Provavelmente,
farão todo o possível para demonstrar seu apoio aos EUA porque pertencem
ao mesmo círculo e sentem sua dor. Igual será o GCHQ (Quartel General
de Comunicações do Governo). Nos preocupa muito o que possa acontecer
com Sara Harrison. No entanto, devemos ter uma visão mais ampla. Existe
uma relação muito estreita entre os EUA e o Reino Unido. É óbvio para
qualquer um. Pouco a pouco, o Estado de direito sofre um colapso. O
mecanismo governamental está acima do povo e do sistema jurídico. O
processo jurídico torna-se cada vez mais secreto. Aqui são introduzidas
as chaves secretas. Inclusive, o Partido Laborista propõe uma cláusula
na legislação para que um soldado não seja criticado, agregando o
discurso do ódio. Isso já recorda o protofascismo. É muito difícil dizer
isso; porém, creio que é uma definição correta. Os EUA tornam as
pessoas extremamente assustadiças. Inclusive, faz com que o The Guardian
tenha muito cuidado com suas publicações. Muitos artigos ficam sem
publicar. Tornam-se muito predizíveis. Ocultam muitos documentos. O
mesmo acontece com os EUA. A partir dessa perspectiva, WikiLeaks é
editor. Pensamos que isso está bem. Seremos o único jogador a continuar
no jogo. Julian Assange é um ativista da liberdade de expressão. Se essa
liberdade lhe é proibida, isso é uma abominação.
Por
outro lado, pode-se perceber o cheiro a pólvora no ar e o fervor da
batalha entre as pessoas que revelam a informação sobre os crimes do
Estado, os crimes de guerra e a violência massiva e aqueles que tentam
ocultá-la. Porém, sabe-se qual das partes está ganhando. Trata-se de um
sério conflito entre o sistema da segurança nacional no Ocidente, que
está crescendo e as pessoas que tentam trazer à luz o que esse sistema
faz. Isso está claro. Porém, o que não está claro é qual destes dois
bandos está ganhando. Bom, já há vários triunfos importantes. Como dizem
muitos jornalistas, "vigiados e processados”
GOLINGER: Podemos falar sobre o filme?
ASSANGE: Bom, o filme ‘El quinto poder’ é… Bem, você já está informada…
GOLINGER: O senhor pensa que esse filme tem como objetivo desacreditar ao senhor e à sua organização?
ASSANGE:
Esse filme vem de Hollywood. Sei em que livros foi baseado.
Definitivamente, os livros foram uma tentativa de desacreditar... E
Dreamworks, por seu lado, recolheu os dois livros mais mentirosos e
desacreditados entre dezenas de outros livros que estão acessíveis.
Creio que isso vem de um âmbito particular. Não sei se foi a tentativa
dos realizadores do filme; mas, esse foi o resultado. As resenhas sobre o
filme têm sido bastante regulares. Creio que, com a informação que
publicamos sobre isso, conseguimos demonstrar com êxito que não se trata
da história fidedigna. É interessante que Disney, dos EUA, que é
responsável pela distribuição lá, publicava meus cartazes com a palavra
"traidor”, escrita sobre meu rosto. É um conceito ridículo, porque sou
australiano. Como poderia ser traidor dos EUA em teoria? É um tipo de
difamação.
Creio
que, finalmente, as pessoas começam a tornar-se imunes a esse tipo de
ataques. Hão sido tantos com o passar do tempo; as pessoas estão vendo a
saga de WikiLeaks; têm visto muitos desses ataques e, acabam concluindo
que não é verdade. Por isso, creio que não seremos afetados pelo filme.
GOLLINGER: Lamentavelmente,
temos que ficar por aqui; não temos mais tempo; porém, são temas de
profundo interesse para o mundo. Vocês têm feito um trabalho
extraordinário que tem aberto um grande debate em âmbito mundial e
agradecemos muitíssimo a presença hoje em nosso programa, Julian
Assange, obrigada por estar no Detrás de la Noticia.
Como sempre, podem seguir-me via Twitter @evagolinger e através de meu blog en actualidad.rt.com. Muito obrigada por estar conosco senhor Assange e até a próxima.
***************
Assange a RT: "EE.UU. pone otra vez el ojo en Latinoamérica"
Avance: Entrevista exclusiva a Julian Assange
Assange: La cinta sobre WikiLeaks solo le gusta a Washington
Avance: Entrevista exclusiva a Julian Assange
Assange: La cinta sobre WikiLeaks solo le gusta a Washington
[Texto completo, em espanhol em: http://actualidad.rt.com/actualidad/view/108109-golinger-julian-assange-detras-noticia].
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