A ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA DOS CRÉDITOS TRABALHISTAS APÓS A EXTINÇÃO DA TR
(*) João Ghisleni Filho
(**) Luiz Alberto de Vargas
Porém, no julgamento da ADI 4.357-DF, o STF deu um passo adiante e
declarou a inconstitucionalidade do parágrafo 12º do art. 100 da
Constituição da República, ao determinar a correção dos precatórios
pelos mesmos índices de remuneração da poupança, ou seja a mesma TR
utilizada para correção trabalhista.
Nas palavras do Relator, Ministro Ayres Britto,
“a
correção monetária é instrumento de preservação do valor real de um
determinado bem, constitucionalmente protegido e redutível à pecúnia.
Valor real a preservar que é sinônimo de poder de compra ou “poder
aquisitivo, tal como se vê na redação do inciso IV do art. 7º da CF,
atinente ao instituto do salário mínimo”.
E mais além:
“Na
medida em que a fixação da remuneração básica da caderneta de poupança
como índice de correção monetária dos valores inscritos em precatório
implica indevida é intolerável constrição à eficácia da atividade
jurisdicional. Uma afronta à garantia da coisa julgada e, por
reverberação, ao protoprincípio da separação dos Poderes. (...) . Se há
um direito subjetivo à correção monetária de determinado crédito,
direito que, como visto, não difere do crédito originário, fica evidente
que o reajuste há de corresponder ao preciso índice de desvalorização
da moeda, ao cabo de um certo período; quer dizer, conhecido que seja o
índice de depreciação do valor real da moeda – a cada período legalmente
estabelecido para a respectiva medição – , é ele que por inteiro vai
recair sobre a expressão financeira do instituto jurídico protegido com a
cláusula de permanente atualização monetária. É o mesmo que dizer:
medido que seja o tamanho da inflação num dado período,
tem-se,naturalmente, o percentual de defasagem ou de efetiva perda de
poder aquisitivo da moeda que vai servir de critério matemático para a
necessária preservação do valor real do bem ou direito
constitucionalmente protegido.”
Assim,
já existe decisão judicial da mais alta Corte declarando a
inconsistência jurídica da adoção da TR como fator de atualização de
débitos judiciais e a exigência normativa de substituição desse índice
por outro que reflita precisamente a desvalorização da moeda em nome da
preservação do direito subjetivo do credor e da eficácia das decisões
judiciais..
Não
se pode negar que as consequências da decretação da
inconstitucionalidade da utilização da TR como índice de correção
monetária não se restringe à atualização dos precatórios, mas se
estende a todos os demais créditos judiciais, inclusive os trabalhistas.
Portanto,
o “zeramento” da TR tem impacto contundente nos processos trabalhistas,
inviabilizando a construção jurisprudencial que, até então, garantia a
correção dos créditos judiciais e gerando a necessidade urgente de nova
interpretação pretoriana que igualmente torne efetiva a norma prevista
na lei 8177/91 que, em essência, visa proteger o crédito laboral da
corrosão inflacionária.
Tal
exigência não é somente ética, mas também jurídica, a partir de
decretação da inconstitucionalidade do uso da TR como fator de
atualização monetária. A substituição da TR por outro índice, esse que
efetivamente reflita a desvalorização monetária decorrente da inflação
não deve tardar, sob pena de grave distorção dos valores devidos nos
processos judiciais trabalhistas.
Como
resultado da cultura inflacionária alta o Brasil ainda possui inúmeros
índices, com as mais variadas metodologias, que medem a inflação de
vários segmentos. Entre os institutos que realizam essa tarefa, os
principais são[4]:
- A FIPE (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (FIPE), da Universidade de São Paulo (USP), que elabora o IPC-FIPE;
- A
Fundação Getúlio Vargas (FGV), entidade privada de ensino, cujo
principal índice é o IGP-M (Índice Geral de Preços ao Mercado);
- O
Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Sócio-Econômicos,
entidade civil sem fins lucrativos, que assessora o movimento sindical e
é responsável pelo ICV (Índice de Custo de Vida);
- O
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), instituição da
administração pública federal e principal fonte de informações e dados
do Brasil, responsável pelo IPC (Índice de Preços ao Consumidor), pelo
INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor) e pelo IPCA (Índice
Preços ao Consumidor Amplo).
Cada índice é calculado com metodologia própria e servem a diferentes finalidades.
Assim,
o IPC-FIPE pesquisa somente a cidade de São Paulo e reflete o custo de
vida de famílias com renda de 1 a 20 salários mínimos. Utiliza
metodologia que atualiza uma ponderação dos preços, de forma a eliminar
bruscas variações sazonais. É um dos mais antigos do país.
O
IGP é uma média ponderada do índice de preços no atacado (IPA) com peso
6; do IPC-RJ, que mede os preços ao consumidor no Rio de Janeiro, São
Paulo, Belo Horizonte, Salvador, Recife, Porto Alegre e Brasília, com
peso 3 e do custo da construção civil (INCC) com peso 1. É usado em
contratos de longo prazo, como aluguel, no reajuste de tarifas públicas e
planos de saúde antiga. Uma variação deste, o IGP-M é elaborado para
contratos do mercado financeiro.
O
ICV-DIEESE, também medido apenas em São Paulo, mede o custo de vida de
família com renda média de R$2.800,00 e foi criado para subsidiar a
negociação coletiva.
O
INPC mede o custo de vida nas principais onze regiões metropolitanas do
país para famílias com renda de 1 a 5 salários mínimos. Resulta do
cruzamento de dois parâmetros: da pesquisa de preço de nove regiões de
produção econômica com a pesquisa de orçamento familiar (POF) que
abrange famílias com renda de 1 a 6 salários mínimos.
O
IPCA é o índice utilizado pelo Banco Central como medidor da inflação
oficial do país. A pesquisa é feita em nove regiões metropolitanas em
famílias com renda mensal de 1 a 40 salários mínimos.
A
variação dos índices depende de inúmeros fatores e, a cada período,
conforme os rumos da economia, um ou outro índice parece mais favorável
ao credor ou ao devedor. Assim, nos últimos doze meses
(jul/2012-jul/2013) , os mais importantes índices apontaram[5]:
INDICE
|
INFLAÇÃO
|
IGP-M
|
5,18%
|
INPC
|
6,38%
|
IPCA
|
6,27%
|
ICV
|
6,63
|
Em
recente artigo publicado na LTr de julho de 2013, César Reinaldo Offa
Basile, sobre a mesma matéria, defende a aplicação do INPC como
“...único índice capaz de recompor satisfatoriamente as perdas
inflacionárias e devolver o poder aquisitivo da moeda nacional”.
Aponta, ainda, o referido articulista, que outras leis, como por exemplo
a 11.430 de 26.12.2006 (que acresceu os artigos 21-A e 41-A e deu nova
redação ao artigo 22 da lei 8.213/1991) e a lei 12.382 de 25.2.2011,
que dispõe sobre diretrizes de valorização do salário mínimo, já lançam
mão de tal indexador.
O
Ministro Castro Meira, do Superior Tribunal de Justiça, proferiu
decisão na Execução em Mandado de Segurança nº 11.761 –
DF(2008/0132683-2), em 27.5.2013 com o seguinte teor, examinando questão
decorrente do posicionamento do STF:
“
Corretos são os cálculos apresentados pela CEJU, porquanto, além de ter
sido o IPCA-E o índice empregado na conta homologada, olvida-se a União
de que o Supremo Tribunal Federal, na ADI 4.357/DF, em 14.3.2013,
declarou a inconstitucionalidade, por arrasto, das expressões
“independentemente de sua natureza”(para efeito de correção monetária) e
“índices oficiais de remuneração básica”, contidos no art.1º F da Lei
9.494/97, com a redação da Lei 11.960/2009.
Significa
dizer que, no tocante à correção monetária, mesmo a partir de
julho/2009, continuará sendo adotado o IPCA-E-IBGE, e não mais o índice
previsto no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na
Justiça Federal.”
Destacamos,
para fins de esclarecimento da referida decisão, que a pretensão
deduzida pela União era no sentido de continuidade da aplicação da TR.
Assim,
entre tantos índices, haverá de se eleger aquele que melhor reflita a
perda do poder aquisitivo do credor trabalhista, tarefa urgente que está
a exigir a reflexão e o debate de todos os operadores jurídicos e da
comunidade trabalhista em geral.
(*) Ambos os autores, são Desembargadores do Trabalho, integrantes da Seção Especializada em Execução do TRT da 4ª. Região.
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