terça-feira, 3 de setembro de 2013

STF: Da inconstitucionalidade do parágrafo 12º do art. 100 da Constituição da República

A ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA DOS CRÉDITOS TRABALHISTAS APÓS A EXTINÇÃO DA TR
(*) João Ghisleni Filho
(**) Luiz Alberto de Vargas
 
Porém, no julgamento da ADI 4.357-DF, o STF deu um passo adiante e declarou a inconstitucionalidade do parágrafo 12º do art. 100 da Constituição da República, ao determinar a correção dos precatórios pelos mesmos índices de remuneração da poupança, ou seja a mesma TR utilizada para correção trabalhista.
Nas palavras do Relator, Ministro Ayres Britto,
 
“a correção monetária é instrumento de preservação do valor real de um determinado bem, constitucionalmente protegido e redutível à pecúnia. Valor real a preservar que é sinônimo de poder de compra ou “poder aquisitivo, tal como se vê na redação do inciso IV do art. 7º da CF, atinente ao instituto do salário mínimo”.
 
E mais além:
 “Na medida em que a fixação da remuneração básica da caderneta de poupança como índice de correção monetária dos valores inscritos em precatório implica indevida é  intolerável constrição à eficácia da atividade jurisdicional. Uma afronta à garantia da coisa julgada e, por reverberação, ao protoprincípio da separação dos Poderes. (...) . Se há um direito subjetivo à correção monetária de determinado crédito, direito que, como visto, não difere do crédito originário, fica evidente que o reajuste há de corresponder ao preciso índice de desvalorização da moeda, ao cabo de um certo período; quer dizer, conhecido que seja o índice de depreciação do valor real da moeda – a cada período legalmente estabelecido para a respectiva medição – , é ele que por inteiro vai recair sobre a expressão financeira do instituto jurídico protegido com a cláusula de permanente atualização monetária. É o mesmo que dizer: medido que seja o tamanho da inflação num dado período, tem-se,naturalmente, o percentual de defasagem ou de efetiva perda de poder aquisitivo da moeda que vai servir de critério matemático para a necessária preservação do valor real do bem ou direito constitucionalmente protegido.”
Assim, já existe decisão judicial da mais alta Corte declarando a inconsistência jurídica da adoção da TR como fator de atualização de débitos judiciais e a exigência normativa de substituição desse índice por outro que reflita precisamente a desvalorização da moeda em nome da preservação do direito subjetivo do credor e da eficácia das decisões judiciais..
Não se pode negar que as consequências da decretação da inconstitucionalidade da utilização da TR como índice de correção monetária não se restringe à atualização dos precatórios, mas se  estende a todos os demais créditos judiciais, inclusive os trabalhistas.
Portanto, o “zeramento” da TR tem impacto contundente nos processos trabalhistas, inviabilizando a construção jurisprudencial que, até então, garantia a correção dos créditos judiciais e gerando a necessidade urgente de nova interpretação pretoriana que igualmente torne efetiva a norma prevista na lei 8177/91 que, em essência, visa proteger o crédito laboral da corrosão inflacionária.
Tal exigência não é somente ética, mas também jurídica, a partir de decretação da inconstitucionalidade do uso da TR como fator de atualização monetária. A substituição da TR por outro índice, esse que efetivamente reflita a desvalorização monetária decorrente da inflação não deve tardar,  sob pena de grave distorção dos valores devidos nos processos judiciais trabalhistas.
Como resultado da cultura inflacionária alta o Brasil ainda possui inúmeros índices, com as mais variadas metodologias, que medem a inflação de vários segmentos.  Entre os institutos que realizam essa tarefa, os principais são[4]:
-                   A FIPE (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (FIPE), da Universidade de São Paulo (USP), que elabora o IPC-FIPE;
-                   A Fundação Getúlio Vargas (FGV), entidade privada de ensino, cujo principal índice é o IGP-M (Índice Geral de Preços ao Mercado);
-                   O Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Sócio-Econômicos, entidade civil sem fins lucrativos, que assessora o movimento sindical e é responsável pelo ICV (Índice de Custo de Vida);
-                   O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), instituição da administração pública federal e principal fonte de informações e dados do Brasil, responsável pelo IPC (Índice de Preços ao Consumidor), pelo INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor) e pelo IPCA (Índice Preços ao Consumidor Amplo).
Cada índice é calculado com metodologia própria e servem a diferentes finalidades.
Assim, o IPC-FIPE pesquisa somente a cidade de São Paulo e reflete o custo de vida de famílias com renda de 1 a 20 salários mínimos. Utiliza metodologia que atualiza uma ponderação dos preços, de forma a eliminar bruscas variações sazonais. É um dos mais antigos do país.
O IGP é uma média ponderada do índice de preços no atacado (IPA) com peso 6; do IPC-RJ, que mede os preços ao consumidor no Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte, Salvador, Recife, Porto Alegre e Brasília,  com peso 3 e do custo da construção civil (INCC) com peso 1. É usado em contratos de longo prazo, como aluguel, no reajuste de tarifas públicas e planos de saúde antiga. Uma variação deste, o IGP-M é elaborado para contratos do mercado financeiro.
O ICV-DIEESE, também medido apenas em São Paulo, mede o custo de vida de família com renda média de R$2.800,00 e foi criado para subsidiar a negociação coletiva.
O INPC mede o custo de vida nas principais onze regiões metropolitanas do país para famílias com renda de 1 a 5 salários mínimos. Resulta do cruzamento de dois parâmetros:  da pesquisa de preço de nove regiões de produção econômica com a pesquisa de orçamento familiar (POF) que abrange famílias com renda de 1 a 6 salários mínimos.
O IPCA é o índice utilizado pelo Banco Central como medidor da inflação oficial do país. A pesquisa é feita em nove regiões metropolitanas em famílias com renda mensal de 1 a 40 salários mínimos.
A variação dos índices depende de inúmeros fatores e, a cada período, conforme os rumos da economia, um ou outro índice parece mais favorável ao credor ou ao devedor. Assim, nos últimos doze meses (jul/2012-jul/2013) , os mais importantes índices apontaram[5]:
INDICE
INFLAÇÃO
IGP-M
5,18%
INPC
6,38%
IPCA
6,27%
ICV
6,63
 
Em recente artigo publicado na LTr de julho de 2013, César Reinaldo Offa Basile, sobre a mesma matéria,  defende a aplicação do INPC como “...único índice capaz de recompor satisfatoriamente as perdas inflacionárias e devolver o poder aquisitivo da moeda nacional”.  Aponta, ainda, o referido articulista, que outras leis, como por exemplo a 11.430 de 26.12.2006 (que acresceu os artigos 21-A e 41-A e deu nova redação  ao artigo 22 da lei 8.213/1991) e a lei 12.382 de 25.2.2011, que dispõe sobre diretrizes de valorização do salário mínimo, já lançam mão de tal indexador.
O Ministro  Castro Meira, do Superior Tribunal de Justiça, proferiu decisão na Execução em Mandado de Segurança nº 11.761 – DF(2008/0132683-2), em 27.5.2013 com o seguinte teor, examinando questão decorrente do posicionamento do STF:
 
“ Corretos são os cálculos apresentados pela CEJU, porquanto, além de ter sido o IPCA-E o índice empregado na conta homologada, olvida-se a União de que o Supremo Tribunal Federal, na ADI 4.357/DF, em 14.3.2013, declarou a inconstitucionalidade, por arrasto, das expressões “independentemente de sua natureza”(para efeito de correção monetária) e “índices oficiais de remuneração básica”, contidos no art.1º F da Lei 9.494/97, com a redação da Lei 11.960/2009.
Significa dizer  que, no tocante à correção monetária, mesmo a partir de julho/2009, continuará sendo adotado o IPCA-E-IBGE, e não mais o índice previsto no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal.”
 
Destacamos, para fins de esclarecimento da referida decisão, que a pretensão deduzida pela União era no sentido de  continuidade da aplicação da TR.
Assim, entre tantos índices, haverá de se eleger aquele que melhor reflita a perda do poder aquisitivo do credor trabalhista, tarefa urgente que está a exigir a reflexão e o debate de todos os operadores jurídicos e da comunidade trabalhista em geral.
(*) Ambos os autores, são Desembargadores do Trabalho, integrantes da Seção Especializada em Execução do TRT da 4ª. Região.
 
 
 


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