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PL 4.330, o Shopping Center Fabril:
Dogville mostra a sua cara e as possibilidades de redenção
Diante
das manifestações de junho, sobretudo em razão da rapidez e da
espontaneidade como se produziram, representantes do governo federal
vieram a público para dizer que não estavam entendendo o que estava
acontecendo. Depois, assumiram que era preciso “ouvir a voz das ruas”.
No
entanto, passado o momento mais agudo das manifestações, menos de dois
meses depois, esse mesmo governo está patrocinando, abertamente, com
apoio de parte da classe empresarial brasileira, a aprovação de um
projeto de lei que amplia as possibilidades de terceirização.
Isso
demonstra, de maneira clara, que o governo continua não entendendo o
que está acontecendo e que, ao contrário do que manifestou, permanece
não escutando a voz das ruas. Por acaso, alguém viu, nas manifestações
de junho, alguém ir às ruas pedir “mais terceirização”, “mais
precarização no trabalho”, “mais segregação” ou “rebaixamento de
salários”? A classe empresarial, ademais, não precisou ir às ruas.
Utilizou-se do mecanismo tradicional da via dos bastidores para conduzir
suas pretensões junto ao governo.
Cumpre trazer tudo isso à tona, para dar continuidade ao processo de esclarecimento da sociedade brasileira.
De fato, seguindo a linha da trama do filme de Lars
von Trier, o PL 4.330 equivale ao momento no qual as pessoas e as
estruturas de poder da pequena cidade de Dogville demonstram o que de
fato são, deixando cair as máscaras e os disfarces. O problema é que
isso só fica claro para quem assiste ao filme. Os protagonistas estão
tão inseridos na lógica da perversidade da exploração sem limites de uma
pessoa vulnerável que as situações são por eles tratadas como normais,
apoiando-se ainda na justificativa de que a submissão se faz necessária
como forma de “ajudar” o explorado.
Da
mesma forma, os protagonistas do PL 4.330 tentam vender a ideia de que
estão fazendo um bem para os trabalhadores, apresentando a medida,
inclusive, como necessária para ajudá-los, conforme relevado na
exposição de motivos do projeto:
O
mundo assistiu, nos últimos 20 anos, a uma verdadeira revolução na
organização da produção. Como conseqüência, observamos também profundas
reformulações na organização do trabalho. Novas formas de contratação
foram adotadas para atender à nova empresa.
Nesse contexto, a
terceirização é uma das técnicas de administração do trabalho que têm
maior crescimento, tendo em vista a necessidade que a empresa moderna tem de concentrar-se em seu negócio principal e na melhoria da qualidade do produto ou da prestação de serviço.
No
Brasil, a legislação foi verdadeiramente atropelada pela realidade. Ao
tentar, de maneira míope, proteger os trabalhadores simplesmente
ignorando a terceirização, conseguiu apenas deixar mais vulneráveis os brasileiros que trabalham sob essa modalidade de contratação. – grifou-se
Trata-se,
no entanto, de argumentos carregados de perversidade, sobretudo quando
tentam justificar e minimizar todas as maldades já cometidas pela
terceirização, ao mesmo tempo em que consideram o aprofundamento da
maldade como algo bom para as vítimas. Não significa nem mesmo de uma
banalização do mal. Representa, isto sim, a convicção em torno da
legitimidade da perversidade, configurando-se, no sentido do disfarce,
uma afronta à inteligência humana.
De
fato, a terceirização ao longo de 20 (vinte) anos em que se instituiu
no cenário das relações de trabalho no Brasil, desde quando foi
incentivada pela Súmula 331, do TST, em 1993, serviu para o aumento
vertiginoso da precarização das condições de trabalho. É impossível ir à
Justiça do Trabalho e não se deparar, nas milhares audiências que
ocorrem a cada dia, com ações nas quais trabalhadores terceirizados
buscam direitos de verbas rescisórias, que deixaram de ser pagas por
empresas terceirizadas, que sumiram.
Esses
trabalhadores, além disso, que já passaram, durante o vínculo de
emprego, por um processo de segregação, de discriminação, de
fragilização, quando não de invisibilidade, ainda se veem obrigados a
suportar anos de lide processual para receber parte de seus direitos.
E
o projeto vem preconizar que terceirização “é técnica moderna de
administração do trabalho”! Mas, de fato, representa uma estratégia de
destruição da classe trabalhadora, de inviabilização do antagonismo de
classe, servindo ao aumento da exploração do trabalhador, que se vê
reduzido à condição de coisa invisível, com relação à qual, segundo a
trama engendrada, toda perversidade está perdoada. E, repita-se, essa
perversidade vem sendo cometida, concretamente, ao longo de 20 (vinte)
anos.
O próprio projeto se trai e revela, na incoerência, a sua verdadeira intenção. Diz que a terceirização advém da “necessidade que a empresa moderna tem de concentrar-se em seu negócio principal”
– grifou-se. Ocorre que o objetivo principal do projeto é ampliar as
possibilidades de terceirização para qualquer tipo de serviço. Assim, a
tal empresa moderna, nos termos do projeto, caso aprovado, poderá ter
apenas trabalhadores terceirizados, restando a pergunta de qual seria,
então, o “negócio principal” da empresa moderna? E mais: que ligação
direta essa empresa moderna possuiria com o seu “produto”?
E
se concretamente a efetivação de uma terceirização de todas as
atividades, gerando o efeito óbvio da desvinculação da empresa de seu
produto, pode, de fato, melhorar a qualidade do produto e da prestação
do serviço, então a empresa contratante não possui uma relevância
específica. Não possui nada a oferecer em termos produtivos ou de
execução de serviços, não sendo nada além que uma instituição cujo
objeto é administrar os diversos tipos de exploração do trabalho. Ou
seja, a grande empresa moderna, nos termos do projeto, é meramente um
ente de gestão voltado a organizar as formas de exploração do trabalho,
buscando fazer com que cada forma lhe gere lucro. O seu “negócio
principal”, que pretende rentável, é, de fato, o comércio de gente, que
se constitui, ademais, apenas uma face mais visível do modelo de
relações capitalistas, que está, todo ele, baseado na exploração de
pessoas conduzidas ao trabalho subordinado pela necessidade e falta de
alternativa.
A
terceirização, ainda, visa a dificultar que se atinja a necessária
responsabilidade social do capital. Nesse modelo de produção, a grande
empresa não contrata empregados, contrata contratantes e estes, uma vez
contratados, ou contratam trabalhadores dentro de uma perspectiva
temporária, não permitindo sequer a formação de um vínculo jurídico que
possa ter alguma evolução, ou contratam outros contratantes,
instaurando-se uma rede de subcontratações que provoca, na essência, uma
desvinculação física e jurídica entre o capital e o trabalho, tornando
mais difícil a efetivação dos direitos trabalhistas, pois o empregador
aparente, aquele que se apresenta de forma imediata na relação com o
trabalho, é, quase sempre, desprovido de capacidade econômica ou, ao
menos, possui um capital bastante reduzido se comparado com aquele da
empresa que o contratou. Vale lembrar que o capital envolvido no
processo produtivo mundial é controlado, efetivamente, por pouquíssimas
corporações, que com a lógica da terceirização buscam se desvincular do
trabalho para não se verem diretamente ligadas às obrigações sociais,
embora digam estar preocupadas com ações que possam “salvar o mundo”!
Em
várias situações o próprio sócio-empresário da empresa contratada,
dependendo do alcance da rede de subcontratações, não é mais que um
empresário aparente, um pseudo capitalista. Ele não possui de fato
capital e sua atividade empresarial é restrita a dirigir a atividade de
trabalhadores em benefício do interesse produtivo de outra empresa. Na
divisão de classes, suplantando as aparências, situa-se no lado do
trabalho. São, de fato, empregados daquela empresa para a qual prestam
serviços, mesmo que seu serviço se restrinja ao de administrar o serviço
alheio.
É
interessante perceber que essa situação da precarização do capital,
como efeito da terceirização e principalmente das subcontratações em
rede, foi visualizada pelos autores do projeto de lei em comento, tanto
que tiveram o “cuidado”, na perspectiva do interesse do grande capital,
de prever que não se forma vínculo de emprego entre o sócio da empresa
terceirizada e a empresa contratante, embora tenham tentado, é verdade,
minimizar os problemas daí decorrentes com a exigência de um capital
mínimo para a constituição da empresa terceirizada, o que, no entanto,
como se verá adiante, não constitui garantia eficiente ao trabalhador e
não anula o problema maior do afastamento entre o capital e a
responsabilidade social.
No
projeto apresentado pelo governo, como explicitado abaixo, há também
preocupação a respeito, aumentando os requisitos financeiros para a
constituição da empresa de terceirização, mas que, da mesma forma, não
evita todos os efeitos perversos já manifestados.
A revelação mais importante que se extrai do projeto é a de que o negócio principal
de uma empresa é a extração de lucro por intermédio da exploração do
trabalho alheio e quanto mais as formas de exploração favorecerem ao
aumento do lucro melhor, sendo que este aumento se concretiza, mais
facilmente, com redução de salários, precariedade das condições de
trabalho, fragilização do trabalhador, destruição das possibilidades de
resistência e criação de obstáculos para a organização coletiva dos
trabalhadores, buscando, ainda, evitar qualquer tipo de consciência em
torno da exploração que pudesse conduzir a práticas ligadas ao
antagonismo de classe.
Eis,
concretamente, o que significa a terceirização e, por óbvio, os
segmentos irresponsáveis da classe empresarial, sobretudo ligados ao
investimento estrangeiro, que pouco se importam com a vida dos
brasileiros, querem que esse modelo se aprofunde ainda mais. Para estes,
quanto mais perversidade melhor, embora queiram enganar a si e a todos,
tentando fazer crer que praticam o bem...
O
engodo fica mais evidenciado na percepção da contradição de um sistema
econômico que tenta vender a ideia de preocupação com o social,
desenvolvendo estratégias de gestão de pessoal voltadas ao que denominam
de “humanização” das relações de trabalho, mas que, ao mesmo tempo,
preconiza que só pode se sustentar por intermédio de um modo de produção
no qual o capital se desvincule do trabalho e, consequentemente, do
trabalhador, para que não tenha que se preocupar com os dilemas pessoais
deste. Do embaralhado de contratos entre empresas, o que se pretende é
que o serviço seja feito, não importando por quem ou o meio que a
empresa terceirizada utilize para que o serviço esteja pronto, na forma,
na quantidade, na qualidade e no prazo contratados. E se o grande
capital possui e exerce esse poder sobre a empresa contratada, esta,
concorrendo com outras para pegar uma parcela do capital, tende a se
relacionar da mesma forma com outras empresas que venha a contratar e,
mais ainda, com os seus trabalhadores subordinados.
É
assim, pois, que se revela toda a falácia das estratégias de gestão –
que o Judiciário insiste em trazer para as suas esferas administrativas
–, que representam, de fato, fórmulas dissimuladas de fazer com que o
trabalhador produza mais e melhor, na perspectiva do interesse exclusivo
do capital, sob a aparência de uma preocupação humana, mas que
escamoteia a constante ameaça do desemprego por inaptidão, em razão de
reestruturação administrativa ou devido a uma crise, que é um fantasma
constante.
As
estratégias de gestão de pessoal assumem ainda o papel de mascarar a
loucura do trabalho, fruto dos desajustes de um sistema que difunde
valores que não consegue garantir: igualdade, liberdade e satisfação
pelo consumo. Transforma todo desajuste em problemas oriundos das
relações pessoais, fazendo com que o trabalhador acredite que o seu
obstáculo é o outro trabalhador, preconizando comportamentos padrões,
que devem ser seguidos e reforçados na identificação de uma tal “laranja
podre”.
A
corporação, que desenvolve internamente essa lógica, apresenta-se aos
trabalhadores como o ente eticamente perfeito, que se insere em um
sistema sem falhas. Os problemas são deslocados para os homens,
cabendo-lhes um esforço de adaptação à padronização que interessa à
corporação, o que é acompanhado da identificação e da punição dos
desajustados. Enquanto isso as corporações jogam o jogo do capitalismo,
suprimindo a concorrência, sonegando impostos, fazendo propaganda
enganosa de seus produtos, destruindo o meio-ambiente...
Esse
modelo de separação e fragilização da classe trabalhadora, seguido da
estratégia meritória, cria uma cumplicidade complexa com relação à
terceirização, pois o “efetivo” tende a se ver em posição privilegiada
frente ao terceirizado, a quem, inclusive, reproduzindo a lógica da
perversidade, pode assediar, mesmo que seja pela fórmula clássica do
mero desprezo, provocando neste o estado de invisibilidade, ao mesmo
tempo em que se submete à supressão de seus próprios direitos,
convencendo-se de que a sua situação podia ser pior. Assim, começa a
acreditar que se a corporação perfeita não paga direitos é porque não
tem condições econômicas de fazê-lo e por isso o erro não está na
corporação mas nos direitos, que são vistos, então, como excessivos.
Toda
essa engenharia gera, também, uma cumplicidade do consumidor, que quer
adquirir um produto mais barato, pouco se importando que o preço baixo
seja efeito de sonegação de impostos e de supressão de direitos. Um
consumidor que, quase sempre, também é trabalhador, mas que no ato do
consumo vê-se com a chance de raciocinar como o capitalista, sendo essa
uma lógica que se produz também entre os chamados “pequenos
investidores”, às vezes não tão pequenos assim, quando são convidados a
integrar o sistema de exploração do trabalho por meio da compra de ações
ou fundos de participação.
Pois
bem, o projeto de lei em questão reforça essa lógica. De forma mais
visível, além do aspecto do aumento da amplitude da terceirização, traz
vários outros elementos concretos da perversidade: responsabilidade
subsidiária, com limitação ao período de execução dos serviços na
tomadora; possibilidade de quarteirização e subcontratação. Tudo sob o
falacioso argumento de que os direitos dos trabalhadores estarão
garantidos com as exigências de especialização da empresa terceirizada, a
constituição por parte desta de um capital social compatível com o
número de empregados, podendo a negociação coletiva prever reserva de
capital da empresa prestadora, e de que os trabalhadores terceirizados
poderão ser representados pelo “sindicato representante da categoria
profissional correspondente à atividade exercida pelo trabalhador na
empresa contratante”.
Mas,
do que está falando o autor do projeto afinal? O capital social,
estabelecido em contrato social, é meramente formal e um capital social
de R$10.000,00, para que se tenha até 10 (dez) empregados, como prevê o
projeto, como garantia efetiva aos trabalhadores, é algo de fazer rir ou
chorar, pois o valor mal dá para garantir as verbas rescisórias de um
empregado que, por exemplo, receba salário mínimo e trabalhe dois anos
na empresa. No estado de São Paulo, o SM é de R$750,00. Com dois anos de
relação de emprego, um empregado dispensado sem justo motivo, que ainda
não tenha gozado as férias do 1º. período, tem direito de receber,
R$750,00 (aviso prévio indenizado); R$1.000,00 (férias com 1/3 - 1º.
período, que seria em dobro caso ultrapassados os dois anos do contrato
de trabalho); R$1.000,00 (férias com 1/3 - 2º. período); R$750,00 (13º.
salário); R$576,00 (40% FGTS), sendo que sobre esses valores ainda
incidem a contribuição social. E isso sob a suposição de que o FGTS
tenha sido integralmente depositado, que não existam horas extras a
serem pagas, que não tenha havido, como quase sempre há, supressão do
intervalo ou outros problemas decorrentes de acidente do trabalho e de
condições insalubres ou perigosas etc. Esse capital social referido não é
suficiente, pois, para o fim a que se propõe. De todo modo, revela o
quanto a precarização está mesmo na base da estratégia da terceirização.
No
aspecto da representação sindical, a coisa é ainda pior, pois no
sistema jurídico brasileiro a categoria é definida em conformidade com a
atividade preponderante da empresa. Ou seja, não existe o tal sindicato
“representante da categoria profissional correspondente à atividade exercida pelo trabalhador na empresa contratante”,
a não ser quando se refira à categoria diferenciada, que atinge, no
entanto, apenas a alguns tipos específicos de profissionais.
Em
suma, a realidade futura que se extrai do PL 4330, caso venha a ser
aprovado, é de empresas constituídas sem empregados, com setores
inteiros da linha de produção, da administração, do transporte e demais
atividades geridos por empresas interpostas cujo capital social é
bastante reduzido se comparado com a contratante, gerando, por certo,
uma redução de ganhos, além de um grande feixe de relações jurídicas e
comerciais, que se interligam promiscuamente, mas que servem para evitar
que os diversos trabalhadores, das variadas empresas, se identifiquem
como integrantes de uma classe única e se organizem.
De fato, ter-se-á a formação de uma espécie de shopping center fabril, onde o objeto principal de comércio é o próprio ser humano.
É
bem verdade que o governo, após ser instituída, na CCJ da Câmara dos
Deputados, uma comissão quadripartite, formada por centrais, governo,
legislativo e empresários, para discutir o projeto de lei, apresentou
uma proposta de texto, que tenta superar alguns problemas do projeto,
mas, concretamente, a proposta do governo não muda a essência do
projeto, que é a ampliação da terceirização, e acaba trazendo problemas
adicionais como o de conduzir a terceirização às atividades rurais,
contrariando a tradição jurídica nacional, ditada pela Lei n. 5.889/73,
que impede a terceirização na produção rural, como mecanismo de proteção
dos trabalhadores rurais, e aos profissionais liberais no exercício de
suas profissões, chegando ao cúmulo de revitalizar as cooperativa de
trabalho na qualidade de entes de prestação de serviços terceirizados.
Ou
seja, nestes aspectos fundamentais, a proposta do governo consegue ser
ainda mais perversa que o projeto original, mesmo que tenha tentado, em
alguns outros aspectos menos relevantes trazer maior rigor à
terceirização, sobretudo no que tange aos requisitos para a constituição
da empresa terceirizada e quanto à obrigação da empresa contratante em
fiscalizar o cumprimento dos direitos trabalhistas por parte da empresa
contratada, prevendo, inclusive, a instituição de garantias financeiras
específicas relacionadas à execução do contrato. Só que tudo isso só
serve para tentar conferir efetividade a direitos já precarizados,
direcionados a trabalhadores que, no processo de deslocamento das
relações jurídicas, tendem a ser segregados e discriminados.
A
proposta do governo admite a terceirização de serviços relacionados ao
conjunto de atividades da empresa contratante e, ainda que
excepcionalmente, continua possibilitando a quarteirização. Trata, é
verdade, do requisito da especialização da empresa prestadora dos
serviços a partir do requisito da previsão no contrato social de um
único objeto, mas isso não inibe que várias empresas, ao mesmo tempo, em
atividades dos mais diversos objetos, prestem serviços
concomitantemente a uma mesma empresa, a qual poderá, por conseqüência,
terceirizar a plenitude de suas atividades, sendo oportuno registrar que
na proposta do governo essa exigência de especialização não é
explicitamente excluída nas atividades de prestação de serviços
realizados por correspondentes contratados por instituições financeiras e
demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do
Brasil, nos termos da regulamentação do Conselho Monetário Nacional,
enquanto não seja editada lei específica acerca da matéria, o que
significa, também, ampliar a terceirização a um ramo de atividade que já
vinha encontrando alguma resistência no Judiciário e, sobretudo, da
classe trabalhadora, dado o aumento da insegurança no trabalho, além do
notório rebaixamento salarial dessa atividade, que até pouco tempo se
exercia, exclusivamente, por bancários.
No
que se refere ao serviço público, a proposta do governo nada diz sobre a
aplicação da Lei n. 8.666/93 e não recusando a aplicação da
terceirização nos setor público deixa uma margem de compreensão ainda
maior quanto à ampliação dos objetos de terceirização na esfera da
Administração pública.
Com
relação à sindicalização, a proposta do governo assume que a contratada
poderá pertencer à mesma categoria econômica da contratante, caso em
que a representação sindical caberá ao sindicato da categoria dos
trabalhadores da contratante. E nas situações em que as categorias
econômicas não forem coincidentes, similares ou conexas, a contratante e
as contratadas, ou seus respectivos sindicatos patronais, não poderão
recusar-se à negociação coletiva suscitada conjuntamente pelos
sindicatos dos trabalhadores, quando houver mais de um, o que significa o
reconhecimento da multiplicidade e da promiscuidade obscura de relações
jurídicas.
A
proposta do governo tenta avançar em termos de proteção dos direitos
trabalhistas aos terceirizados, mas o faz timidamente, conferindo
apenas: I- a alimentação garantida aos empregados da contratante, quando
oferecidos em refeitórios; II- o direito de utilizar os serviços de
transporte; III- o atendimento médico ou ambulatorial existentes nas
dependências da contratante ou local por ela designado; IV-o treinamento
adequado quando a atividade exigir; e V- as condições sanitárias e
medidas de proteção à saúde e segurança, e instalações em condições
adequadas ao cumprimento do serviço prestado pela empresa contratada.
Garantias, de todo modo, pouco relevantes, na medida em que se a
terceirização preconizada no projeto e mesmo da proposta do governo for
levada adiante não existirão, concretamente, pelo menos de forma
predominante, os tais empregados da empresa contratante.
Toda
essa engenharia legislativa voltada à ampliação da terceirização se
põe, inegavelmente, a serviço da reprodução do grande capital que,
inclusive, visualizando os benéficos que esse mecanismo lhe proporciona
não raro chega, ele próprio, a constituir empresas de prestação de
serviços para execução de tarefas na suas empresas principais,
fazendo-o, por certo, de forma disfarçada.
Destaque-se
que a responsabilidade subsidiária da empresa tomadora, também
preconizada no projeto e reproduzida na proposta do governo, não altera a
perversidade da situação, constituindo, aliás, a própria origem da
maldade. De fato, a responsabilidade subsidiária serve apenas como uma
forma de proteção da empresa tomadora, para que esta não seja obrigada a
pagar nada ao trabalhador terceirizado antes que este tente fazê-lo com
relação à empresa prestadora. Essa situação, em concreto, conforme se
extrai da experiência judicial, serve apenas para impor mais um
sacrifício ao trabalhador, pois essa tentativa, que é quase sempre
frustrada, atrasa por, no mínimo, um ano o processo de execução. Aliás,
nem mesmo uma responsabilidade solidária, quando não provada a
fiscalização do cumprimento das obrigações trabalhistas por parte da
empresa contratante em face da contratada, como previsto na proposta do
governo, não anula a perversidade que se situa na terceirização em si.
Com
a responsabilidade proporcional ao período da execução de serviços,
referida no projeto e na proposta do governo, busca-se legitimar duas
práticas extremante perversas, supressivas da condição humana:
a)
a iniciativa do empregador de fazer com que um trabalhador, durante a
mesma relação jurídica formada com a empresa prestadora, execute
serviços a vários tomadores, o que causa ao trabalhador inúmeras
dificuldades de ordem processual por ter que litigar contra diversas
empresas ao mesmo tempo, todas elas com suas defesas repletas de
objeções e incidentes, e no que se refere à produção de prova sobre os
fatos que se relacionam à supressão de seus direitos, além de tornar a
vida do trabalhador um autêntico inferno, com constantes alterações de
horários e de local de trabalho, ou mesmo de setor dentro da mesma
empresa;
b)
a atitude do empregador de retirar o trabalhador da execução de
serviços, colocando-o no plantão, próximo do momento em que pretende
cessar a relação de emprego, tentando fazer com que nenhuma empresa
tomadora seja responsabilizada pelo valor correspondente às verbas
rescisórias, isto quando não transfere o trabalhador para um posto de
serviço situado em outra cidade, forçando-o a pedir demissão, sob a
ameaça de dispensa por justa causa por abandono de emprego.
No
projeto de lei, assim como na proposta do governo, verifica-se, ainda, a
desfaçatez de tentar conduzir as relações jurídicas originadas da
terceirização ao âmbito exclusivo do Direito Civil. Uma atitude,
portanto, de afronta deliberada ao Direito do Trabalho, para que a
vontade das partes, de indisfarçável ampliação da exploração do ser
humano trabalhador, não seja impedida pela incidência dos princípios
jurídicos trabalhistas. Claro que é uma tentativa vã, mas que não exclui
a sua perversidade, só pelo fato de existir.
Em
suma, o PL 4.330, emendado pela proposta do governo, representa, sem a
menor dúvida, uma violência explícita aos trabalhadores e ao Direito do
Trabalho. Equivale, como dito, ao momento em que, no filme mencionado,
aqueles que comandam a pequena cidade de Dogville revelam suas
verdadeiras personalidades e suas intenções no que se refere à
exploração do trabalho alheio, indo ao ponto da plena desconsideração da
condição humana do explorado, aproveitando-se ao máximo de sua
vulnerabilidade.
Na
perspectiva do setor público, que não se encaixa nem perifericamente ao
argumento da justificativa do projeto no aspecto da modernidade do
processo produtivo, a terceirização aparece como mera estratégia de
diminuição de custos para proporcionar ajustes orçamentários. O projeto
bem que tenta uma justificativa jurídica para a terceirização no setor
público, com os seguintes argumentos:
No caso de contratação com a Administração Pública, o projeto remete à Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, que “regulamenta
o artigo 37, inciso XXI, da Constituição Federal, institui normas para
licitações e contratos da Administração Pública e dá outras
providências”.
Isso
significa que a Administração Pública é solidariamente responsável
quanto aos encargos previdenciários, mas não quanto às dívidas
trabalhistas. – grifou-se
Esquece-se,
no entanto, de forma proposital, que os serviços referidos do inciso
XXI, do art. 37, da Constituição Federal, não são os serviços atinentes à
dinâmica permanente da Administração, pois para tais serviços, que são
executados por servidores públicos, há o requisito do concurso público,
previsto nos incisos I e II do mesmo artigo, sendo que as únicas
exceções se situam no âmbito do percentual dos cargos de confiança e da
execução de tarefas temporárias de caráter excepcional.
É
tão óbvio que a expressão serviços contida no inciso XXI não pode
contrariar a regra fixada nos incisos I e II, que chega mesmo a ser
agressivo tentar fundamentar o contrário. Ora, se um ente público
pudesse contratar qualquer trabalhador para lhe prestar serviços por
meio de uma empresa interposta os incisos I e II não teriam qualquer
eficácia, já que ficaria na conveniência do administrador a escolha
entre abrir o concurso ou contratar uma empresa para a execução do
serviço.
O
inciso XXI, evidentemente, não pode ter tal significação. Tomando o
artigo 37 em seu conjunto, os “serviços”, tratados no inciso XXI, só
podem ser entendidos como algo que ocorra fora da dinâmica permanente da
administração.
Não
se pode entender, a partir da leitura do inciso XXI, que o ente
público, para implementar uma atividade que lhe seja própria e
permanente, possa contratar trabalhadores por meio de empresa
interposta, até porque, se pudesse, qual seria o limite para isto?
Afinal, serviço é a o que realizam todos os que trabalham no ente
público. O que fazem os juízes, por exemplo, senão a prestação de
serviços ao jurisdicionado?
Se
na expressão “serviços”, a que se refere o inciso XXI, pudessem ser
incluídos os serviços que se realizam no âmbito da administração de
forma permanente não haveria como fazer uma distinção entre os diversos
serviços que se executam, naturalmente, na dinâmica da administração,
senão partindo do critério não declarado da discriminação, retomando,
ademais, o caráter escravista que influenciou a formação da sociedade
brasileira. Mas, isto, como se sabe, ou se deveria saber, fere
frontalmente os princípios constitucionais da não discriminação, da
isonomia, da igualdade e da cidadania.
Vale
a pena perceber que o PL 4.330 não limita as possibilidades de
terceirização e a Lei n. 8.666/93, citada no projeto, também não
estabelece um critério para diferenciar o serviço que pode ou não ser
terceirizado. Assim, em breve se verá o argumento de que a nova lei
permitiu uma terceirização mais ampla – e até irrestrita – também no
serviço público. Claro que se pode objetar a essa previsão com o
argumento de que uma ampliação irrestrita da terceirização no setor
público não teria respaldo constitucional. No entanto, a Constituição
também não dá guarida à terceirização nos serviços de limpeza e de
vigilância e mesmo assim ela está aí, sem qualquer enfrentamento de
constitucionalidade, sendo praticada nos próprios entes responsáveis
pela aplicação da Constituição...
Concretamente,
na esfera do serviço público, já se pode verificar a perversidade do
projeto com o reforço da ideia de que o ente público não é
responsabilizado pelos direitos trabalhistas dos terceirizados. Ou seja,
comete-se uma agressão à Constituição, que não permite a terceirização
no setor público, e tenta-se levar a situação ao extremo, afastando o
ente público da obrigação de garantir a efetividade dos direitos
daqueles que lhe prestam serviços, sob o falso manto da legalidade, qual
seja, o art. 71, da Lei n. 8.666/93, que, em verdade, sequer teria
aplicação no caso. Ora, se a Constituição não traz qualquer regra
prevendo a terceirização no setor público como a lei infraconstitucional
pode regular tal situação fática?
De fato, a Lei n. 8.666/93, de 21 de junho de 1993, que regula o processo de licitação, considera como “Serviço - toda
atividade destinada a obter determinada utilidade de interesse para a
Administração, tais como: demolição, conserto, instalação, montagem,
operação, conservação, reparação, adaptação, manutenção, transporte,
locação de bens, publicidade, seguro ou trabalhos técnico-profissionais”
(inciso II, do art. 6o.), pressupondo o seu caráter temporário, conforme previsão do art. 8o. da mesma lei: “A execução das obras e dos serviços deve programar-se, sempre, em sua totalidade, previstos seus custos atual e final e considerados os prazos de sua execução.” – grifou-se
Mas,
nada disso interessa para os defensores da terceirização. O que
interessa mesmo é formalizar um ajuste entre os interesses econômicos e
políticos em torno do comércio de gente. O econômico caracterizado pela a
lógica da redução do custo, o aumento da exploração e a destruição
concreta das possibilidades de resistência por parte da classe
trabalhadora. O político pela preservação do poder, o que é favorecido
pelo ato de agradar ao poder econômico, sem desconsiderar os interesses
orçamentários dos entes públicos, que se dá com a redução do custo da
mão-de-obra que a terceirização possibilita e com a manutenção da
eficiência em termos de arrecadação. Veja-se, neste último aspecto, que,
nos termos do projeto, ao contrário do que se passa com os direitos
trabalhistas, é solidária a responsabilidade das empresas tomadoras no
que se refere às contribuições previdenciárias.
É
fácil perceber, portanto, toda a maldade tanto do governo federal
quanto de parte relevante do empresariado brasileiro ao sustentarem a
estrutura valorativa trazida no PL 4.330. E não adianta tentarem
escamotear, dizendo que estão fixando garantias para que os direitos dos
terceirizados sejam respeitados, pois a sociedade brasileira que foi às
ruas não será mais facilmente enganada. Os donos do poder parecem que
ainda não entenderam isso. Não compreenderam que os gritos das ruas são
resultado de uma insatisfação com as estruturas de poder que nos tenta
ludibriar. Também desprezam os compromissos cristalizados
constitucionalmente, dentre os quais, vale destacar: a dignidade humana,
o valor social do trabalho, a função social da propriedade, a
moralidade administrativa, a prevalência dos direitos humanos e o
desenvolvimento de uma ordem econômica pautada pelos ditames da justiça
social.
Imagina-se
que quanto ao governo federal ainda haja tempo de uma redenção,
rechaçando o projeto, retirando as suas propostas, e iniciando uma
política de reversão da terceirização no setor público. De forma mais
concreta, apresenta-se, no momento, a chance de redenção ao Congresso
Nacional, que se daria mediante rejeição do projeto e das propostas do
governo. Essa possibilidade também se apresenta para a parte do segmento
empresarial brasileiro que se diz socialmente responsável e que pauta
sua conduta na lógica do desenvolvimento econômico e social do país,
apoiando a derrota do projeto no Congresso.
Há
de se considerar, ainda, a possibilidade de redenção de uma parte da
própria classe trabalhadora, que, a bem da verdade, ao longo de anos se
associou ao capital no processo de legitimação da terceirização sob a
perspectiva egoísta de não dividir o bolo de eventuais conquistas
econômicas ou garantias jurídicas com um maior número de trabalhadores,
ainda mais com o tal pessoal da limpeza e das portarias, empenhando-se,
pois, não apenas na reprovação do projeto e das propostas do governo
como também na luta pelo fim da terceirização.
Se
forem ultrapassadas essas oportunidades e o projeto, com ou sem as
emendas sugeridas pelo governo, vier a ser aprovado, abrir-se-á, então,
aos entes representativos das classes trabalhadores a sua chance de
redenção, retomando, enfim, um direcionando de luta concreta em defesa
dos interesses dos trabalhadores, sem preocupação direta com os efeitos
dessa luta para a sustentabilidade do governo, redimindo-se, inclusive,
do fato de terem se sentado à mesa com empresários e governo para entrar
em acordo com relação à regulamentação da terceirização quando, de
fato, tinham que se opor a todo tipo de terceirização, dado o notório
efeito de supressão da condição humana dessa estratégia produtiva,
conforme verificado ao longo de 20 (vinte) anos de experiência concreta.
Nesta
perspectiva é importante que a classe trabalhadora perceba que nem
mesmo a mera rejeição do PL 4.330 constitui uma vitória completa, vez
que a terceirização que está aí precisa ser combatida, na medida em que
agride vários preceitos jurídicos, sobretudo no âmbito do setor público,
tendo se apresentando, de fato, como uma espécie de semi-escravidão.
Se
nenhuma dessas redenções sobressair e o projeto passar e virar lei,
muitos problemas podem desde já ser vislumbrados, além daqueles já
destacados.
O
primeiro, inegavelmente, é o da insegurança jurídica para todos que
constituam relações jurídicas a partir do pressuposto exclusivo das
regras do referido projeto e, principalmente, sob as bases das previsões
relacionadas na proposta do governo no que tange à terceirização no
campo e por intermédio de cooperativas de trabalho, isso porque esse
conjunto de regras fere vários princípios e institutos jurídicos do
direito constitucional, dos direitos humanos e do direito do trabalho. A
intenção da lei, assim votada, visando favorecer aos interesses
econômicos de alguns segmentos empresariais e políticos do governo não
se amolda, obviamente, ao projeto constitucional de elevação da condição
humana a partir dos valores já mencionados. Lembre-se que as relações
de trabalho são reguladas pelo direito do trabalho, cujo princípio é o
da elevação progressiva das condições sociais e econômicas dos
trabalhadores, estando coibida a lógica do retroceder.
Vale
frisar que a insegurança jurídica destacada não diz respeito apenas aos
custos da invalidade da terceirização, por aplicação, por exemplo, da
teoria da subordinação estrutural, como determinante da relação de
emprego, incluindo, também, a teoria da subordinação em rede, que serve
para reatar os vínculos jurídicos entre o verdadeiro capital e o
trabalho, com a consequente responsabilização social, mas também
pertinentes aos custos que decorram de indenizações por dano moral
individual e por dano social, na medida em que a prática agressiva à
condição humana constitui, por si, grave atentado à ordem jurídica
individual e social.
Lembre-se
que o próprio PL considera que o pagamento por parte da empresa
tomadora de serviços de dívidas que seriam, sob a ótica exclusiva do PL,
prioritariamente da empresa prestadora gera para a empresa tomadora o
direito ao recebimento de uma indenização da empresa prestadora, além do
ressarcimento do valor pago.
Ora,
com muito mais razão o empregado que prestou seu serviço e não recebeu
os valores correspondentes aos seus direitos no momento oportuno, sendo
que tais direitos com relação ao empregado possuem natureza alimentar,
tem direito, óbvia e objetivamente, ao recebimento de uma indenização, o
que não inibe a indenização devida à sociedade pelo ferimento do
projeto constitucional em torno da formação de um capitalismo
socialmente responsável.
O
segundo, o do atolamento do Judiciário em conflitos sem fim, tanto no
que se refere às diversas discussões jurídicas geradas pelas múltiplas
contratações, relações promíscuas e supressões de direitos, assim como
no que se referem àquelas que digam respeito a situações mais graves
como a do trabalho em condições análogas à escravidão e a dos acidentes
do trabalho.
Claro
que, fazendo um exercício otimista, pode até ser que a solidariedade de
classe se reconstitua das cinzas. Afinal, como efeito real, a
terceirização deixaria de existir, pois se todos são terceirizados,
nenhum trabalhador de fato é. Assim, os que hoje são “efetivos”, que são
contratados diretamente pela grande empresa, atuando na linha de
produção, e que chegam a considerar que a luta contra o PL 4.330 não
lhes diz respeito, se verão, em pouquíssimo tempo, envolvidos numa
relação de trabalho terceirizada e se sentirão tão segregados quanto
hoje se sentem o trabalhador da limpeza e o vigilante.
As
perguntas que ficam são: que tipo de racionalidade produzirão todos
esses trabalhadores quando sua consciência de classe for reconstruída
sob a base do reconhecimento de que esse sistema econômico e político
que aí está os conduziu ao fundo do poço? Que os submeteram a uma
exploração assumidamente desumana e ideologicamente violenta... Estarão
esses trabalhadores dispostos a dialogar, a se associar e a renegociar
com esses setores político e econômico? Experimentando a sensação de
poder, advindo da consciência e da ação coletiva descomprometida com
interesses políticos partidários desvinculados de uma racionalidade de
classe, estarão dispostos a perdoar aqueles que, com requintes de
crueldade, desconsideraram a sua condição humana e levaram adiante um
projeto assediante para se aproveitarem, sem qualquer limite, do seu
estado de vulnerabilidade?
Não
sei as respostas e não me compete fazer conjecturas a respeito. As
indagações ficam, de todo modo, como uma reflexão para aqueles que têm
demonstrado possuir interesse direto na aprovação do PL 4.330, tal qual
foi apresentado ou nos termos das propostas trazidas pelo governo, sendo
certo que as ruas continuarão se apresentando como um palco
privilegiado para a produção e a difusão do conhecimento popular e
classista necessário para um posicionamento a respeito desse tema tão
relevante no processo da construção de uma sociedade brasileira
efetivamente mais justa e solidária.
São Paulo, 07 de agosto de 2013.
(*) Professor livre-docente da Faculdade de Direito da USP. Juiz do trabalho.
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