- O carvão, um assassino silencioso
Por Marcela Valente*
A única maneira de combater a contaminação com
carvão é fechar todas
as minas e usinas do mundo e desenvolver somente energias
alternativas, afirma especialista norte-americano.
Buenos Aires, 26 de abril (Terramérica).- Os acidentes fatais em minas
de carvão, como os ocorridos nos Estados Unidos e na China, causam
comoção. Mas o médico norte-americano Alan Lockwood alertou que são
muito mais as mortes pela contaminação derivada da exploração desse
mineral. Com o apoio de estudos da organização Médicos para a
Responsabilidade Social (filiada à Internacional Physicians for the
Prevention of Nuclear War, ganhadora do Nobel da Paz em 1985),
Lockwood afirma que o carvão provoca doenças cardíacas e respiratórias
crônicas, danos cerebrais e câncer, que estão entre as cinco
principais causas de mortes nos Estados Unidos.
Suas conclusões e as de outros especialistas foram divulgadas em
novembro no informe “O impacto do carvão sobre
a saúde humana”. Ali há
o alerta sobre as doenças causadas pelo mineral, desde sua extração
até a disposição final dos resíduos, passando pela queima para
produzir eletricidade. Apesar dos danos à saúde e à atmosfera pela
emissão de gases-estufa, a matriz energética mundial tem o carvão como
primeira fonte. China, Estados Unidos, África do Sul, Polônia,
Austrália e Israel, entre outros, produzem a maior parte de sua
eletricidade com base neste mineral.
O Greenpeace Argentina, que protesta contra a construção de uma usina
de carvão no Rio Turbio, sudoeste da província de Santa Cruz, convidou
Lockwood para visitar Buenos Aires, ocasião em que conversou com o
Terramérica.
Terramérica: Que impacto tem a produção de carvão na saúde humana?
Alan Lockwood: Dezenas de milhares de pessoas morrem por ano nos
Estados Unidos e muitas outras sofrem doenças graves ou menores,
como
asma e afecções pulmonares obstrutivas crônicas e câncer de pulmão.
Também ataques cardíacos, apoplexia ou redução da capacidade
intelectual.
Terramérica: Estes impactos devem ser somados às doenças derivadas da
mudança climática?
AL: Sim. O dióxido de carbono é o gás contaminante mais conhecido, mas
há outros, como o metano, que também deriva desta atividade e que tem
um efeito estufa 20 vezes mais potente do que o anterior. Isto aumenta
as doenças associadas ao aumento da temperatura, como dengue, malária,
diarréia provocada por inundações e pela contaminação da água, todos
problemas de saúde ligados à mudança climática.
Terramérica: Quais as fases da produção de carvão que mais contaminam?
AL: A maior é a da queima. Mas desde que os trabalhadores o extraem da
mina até as cinzas que vão parar em depósitos de lixo, todos são
passos que têm impacto
na saúde.
Terramérica: Quais substâncias tóxicas derivam da mineração e
combustão do carvão?
AL: Principalmente dióxido de enxofre, óxido de nitrogênio, mercúrio e
materiais particulados, que são pequeníssimos, com 2,5 micrômetros ou
menos. Além de materiais radioativos, como urânio e tório, que estão
dentro do carvão e vão para a atmosfera. Alguns, inclusive, acabam nos
lugares de eliminação das cinzas.
Terramérica: É preciso estar muito perto de uma mina ou de uma central
para se contaminar?
AL: Não necessariamente. Claro, quanto mais perto de uma usina de
carvão mais perigoso é. Porém, muitos destes contaminantes percorrem
longas distâncias pelo ar até serem inalados, e também chegam por meio
da água. O mercúrio, por exemplo, fica no ar, a chuva o leva para
cursos fluviais, daí chegam aos peixes que logo serão nosso alimento.
Não há como escapar do
carvão.
Terramérica: Por que em seu informe não são mencionados os acidentes
em minas como parte do impacto do carvão na saúde?
AL: Não aparecem por falta de espaço, salvo uma referência geral aos
perigos da mineração. Mas agora estou escrevendo um livro para
publicar dentro de dois anos e nele dedicarei um capítulo a esse
assunto. Nos Estados Unidos, está muito presente nas notícias por
causa do acidente em West Virginia (onde em março uma explosão matou
29 mineradores), mas na China são milhares os trabalhadores em minas
de carvão que morrem por ano vítimas de acidentes.
Terramérica: Então, os acidentes devem ser considerados parte dos
efeitos sanitários da mineração de carvão?
AL: Sim. Mas apesar desses terríveis acidentes, que são notícias de
grande impacto, pior é a morte de 10 mil a 20 mil pessoas por ano nos
Estados Unidos por doenças relacionadas ao carvão.
E a imprensa nada
fala sobre isto.
Terramérica: O que recomenda, então, para gerar energia? Fechar as
minas e as centrais térmicas? Produzir de forma mais limpa?
AL: O que se deve fazer é desenvolver energias alternativas como
solar, eólica, hidrelétrica e de marés, que não produzem dióxido de
carbono, enxofre, dióxido de nitrogênio nem mercúrio. Assim se
favorece o uso eficiente da eletricidade. É uma boa estratégia para
criar bons empregos, fazer crescer a economia e cuidar do meio
ambiente e da saúde.
* A autora é correspondente da IPS.
Crédito da imagem: Gentileza do Greenpeace
Legenda: Alan Lockwood.
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