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No Dia do Trabalhador, juiz defende lei de greve mais afinada com a Constituição
01/05/2014
Esta quinta-feira, 1º de maio, é o Dia do Trabalhador. Justo nesse dia, a capital federal convive com mais uma greve dos metroviários, que já dura quase um mês e causa uma série de transtornos à cidade. A Constituição Federal garante aos trabalhadores o direito de greve. Mas os recorrentes movimentos – principalmente nos serviços ditos essenciais – como transportes, segurança, correios e outros –, trazem à tona uma discussão frequente em todo o meio jurídico trabalhista: a necessidade, ou não, de se modernizar as leis que regem esses movimentos de paralisação.
Foto:Juiz Grijalbo Coutinho
Para o juiz titular da 19ª Vara do Trabalho de Brasília, Grijalbo Fernandes Coutinho, autor de diversos livros doutrinários sobre direito trabalhista, é preciso renovar a legislação que trata do tema, para que surja “uma lei de greve mais enxuta e afinada com o fundamento do artigo 9º da Constituição”. O dispositivo assegura o direito de greve e afirma que compete aos trabalhadores “decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele se defender”. Para Grijalbo, a lei de greve em vigor estaria em confronto com preceitos fundamentais, limitando, em muitos casos, o direito de paralisação dos trabalhadores.
O ideal seria que o poder Judiciário interferisse o mínimo possível nos movimentos grevistas, permitindo que empresas e empregados possam chegar a acordos que atendam aos interesses das partes. Mas a cultura sedimentada no Brasil, há muitos anos, acaba atribuindo à Justiça do Trabalho a responsabilidade para resolver o conflito. “Muitas vezes, lamentavelmente, as partes coletivas (empresas e sindicatos obreiros) aguardam confortavelmente a decisão do Poder Judiciário, sem maiores esforços por uma eventual solução direta”.
Confira, a íntegra da entrevista:
A CLT é de 1943. A Lei de Greve (Lei 7.783/1989) vai completar 25 anos em 2014. O senhor acha que a legislação sobre greve é atual e atende aos anseios da sociedade?
Grijalbo Coutinho: Não atende. Por outro lado, não se trata de uma questão de tempo ou envelhecimento da norma legal, mas, na verdade, de algumas das balizas ali postas em confronto com determinado preceito fundamental. A lei em vigor é bastante limitadora do exercício do direito de greve. Nunca é demais relembrar que o movimento de paralisação das atividades, pelos trabalhadores, foi erigido a princípio fundamental na Constituição de 1988. Os limites para o seu exercício, estão bem delineados no artigo 9º. Devem ser coibidos os abusos, evidentemente. A permanência da greve, por mais longo que seja o período de mobilização, a meu ver, está longe de configurar o denominado abuso do direito de greve.
No seu entendimento, a lei privilegia mais os trabalhadores ou os patrões?
Grijalbo Coutinho: Como elemento de mitigação do direito de greve, o que ocorre, por exemplo, na exigência da adoção de procedimentos formais para a sua decretação, na possibilidade de substituição dos trabalhadores regularesdurante o período de paralisação e no elenco exacerbado das atividades essenciais, a norma legal reguladora da matéria encontra-se, em algumas passagens, em descompasso com a garantia maior prevista na Constituição Federal. Nesse sentido,a sua preocupação central é com a proteção da atividade econômica sem sobressaltos, ao contrário do almejado pelo constituinte originário.
Como o senhor vê a interferência do poder Judiciário na busca de soluções dos movimentos de paralisação, quando se instala a discordância entre patrões e empregados?
Grijalbo Coutinho: O ideal é que as partes em conflito, durante o movimento paredista, pudessem se compor ou não, tudo sem a interferência estatal, cujo entendimento ou a sua falta resultasse da simples correlação de forças políticas no embate entre o capital e o trabalho, isto no curso da greve.Não é isso que acontece na prática. A cultura sedimentada entre os mais diversos atores, com destaque para o Estado legislador, desde os anos 1930, foi no sentido de atribuir à Justiça do Trabalho competência constitucional para resolver o conflito. Muitas vezes, lamentavelmente, as partes coletivas (empresas e sindicatos obreiros) aguardam confortavelmente a decisão do Poder Judiciário, sem maiores esforços por uma eventual solução direta.
A quem interessa mais a judicialização dos movimentos grevistas?
Grijalbo Coutinho: Para acabar com o movimento paredista,é evidente que a judicialização interessa muito mais à parte afetada pela greve em seus negócios e na sua atividade econômica, porque, via de regra, o objetivo patronal é obter a chancela judicial capaz de pôr fim à greve e alcançar ainda a punição obreira por alegados abusos. No entanto, em determinadas circunstâncias históricas, especialmente em um momento político de voracidade e exacerbada força do poder econômico, a intervenção da Justiça do Trabalho pode ser favorável ao empregado, tanto para abrir a negociação coletiva emperrada, quanto para fixar condições de trabalho peremptoriamente rejeitadas pelo capital.
Como é a atuação do judiciário trabalhista nas situações de greves? A lei exige muito dos tribunais do trabalho, ou abre pouco espaço para a atuação judicial?
Grijalbo Coutinho: O Judiciário tem atuado com moderação para tentar equilibrar a desigualdade natural da relação entre o capital e o trabalho. É tarefa, sem nenhuma dúvida, das mais árduas. Somente uma pesquisa científica rigorosa será capaz de revelar o papel histórico da Justiça do Trabalho no enfrentamento do tema. Os sindicatos obreiros mais combativos e os historiadores identificados com o valor trabalho são profundamente críticos em relação ao papel desempenhado pelo Judiciário ao longo de várias décadas. Os patrões, por uma outra vertente ideológica, também não recebem com simpatia a atuação da Justiça do Trabalho no exercício do poder normativo, especialmente nos últimos anos.
A lei exige muito dos tribunais do trabalho, ao mesmo tempo em que limita a sua atuação quando veda, no exercício do poder normativo, a fixação de reajuste salarial com base na inflação do período passado. Ou seja, em uma questão fundamental, normalmente a primeira e a mais importante reivindicação dos trabalhadores, a Justiça do Trabalho, se aplicar a norma legal pelo método de interpretação literal, estará de mãos atadas para conseguir o modo mais justo de solucionar o conflito. Melhor dizendo, precisará fazer mágica para solucionar o conflito, muitas vezes desagradando uma ou todas as partes envolvidas no litígio.
O senhor vê necessidade de mudanças na legislação sobre greve, como no caso dos dissídios coletivos?
Grijalbo Coutinho: Vejo, sim. Uma lei de greve mais enxuta e afinada com o fundamento do artigo 9º, da Constituição. Enquanto ela não vier, cabe ao Tribunal do Trabalho encontrar a solução ajustada e afinada com a norma fundamental. Sobre os dissídios coletivos, tenho algumas dúvidas, no momento. Sempre fui favorável ao fim do poder normativo. O problema é que o novo artigo 114 da Constituição, no particular, ficou no meio termo, aliás, no pior termo possível. Preserva o poder normativo apenas para cuidar da greve e reprimi-la. "O comum acordo" não funciona na atual conjuntura política. É crescente a insatisfação das lideranças sindicais obreiras com os patrões, sob o argumento de que até mesmo na data base há rejeição a qualquer tipo de negociação.
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