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Diagnóstico da Saúde do Trabalhador em Blumenau
A preocupação com os trabalhadores vítimas das constantes mudanças e precarização dos processos e relações de trabalho, motivou a pesquisa e o desenvolvimento de um Banco de Dados em Saúde do Trabalhador em Blumenau, proporcionando a análise dos dados do Centro de Referência em Saúde do Trabalhador - CEREST, Instituto Nacional de Seguridade Social - INSS, do Ministério Público do Trabalho - MPT, de vários Sindicatos de Trabalhadores e do Controle Social no Conselho Municipal de Saúde de Blumenau. Mesmo com os constantes avanços das políticas públicas voltadas à saúde do trabalhador, especialmente impulsionadas pelos princípios inseridos na Constituição Federal de 1988, encontramos resistência na concepção do problema do adoecimento do trabalhador como uma epidemia, o que dificulta a análise e a definição de estratégias de prevenção.
No trabalho de extensão que realizamos com a Associação dos Portadores de LER/DORT de Blumenau e Região - APLER e com o Conselho Intersindical de Saúde e Ambiente de Trabalho - CISAT, pela Universidade Regional de Blumenau - FURB, percebemos que há um número elevado de trabalhadores com doenças ocupacionais, e pensamos que construindo um Banco de Dados em Saúde do Trabalhador, podemos ter um diagnóstico mais preciso do problema e especialmente para qualificar os trabalhadores, representantes sindicais e comunidade, para exercerem o controle social da política pública de saúde do trabalhador.
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Nas instituições citadas anteriormente, pesquisamos os cadastros, identificando o número de trabalhadores acidentados atendidos, classificando-os por categoria econômica das empresas, função exercida pelos referidos trabalhadores, tipo de acidente (típico ou atípico/doença ocupacional ou de trajeto), assim como parte do corpo afetada - se a lesão é física ou psíquica. A pesquisa contou com o trabalho das acadêmicas do Curso de Direito da FURB Suelen Silvy, Ana Paula Tabosa dos Santos e especialmente, Débora Ferrazzo.
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Ter consciência do seu ser e agir politicamente no mundo do trabalho, na sociedade capitalista globalizada não é tarefa fácil, prevalecendo, muitas vezes, a sujeição do trabalhador no lugar da resistência e da emancipação. Os trabalhadores vivenciam situações contraditórias, as quais favorecem a rivalidade entre os colegas, a competição e o individualismo, principalmente influenciadas e incentivadas pelas estratégias muitas vezes perversas de gestão utilizadas no mundo do trabalho. Esta condição de sujeição do trabalhador no mundo do trabalho acaba gerando o seu adoecimento, através das chamadas "doenças ocupacionais", reveladas especialmente através da DORT - distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho, e da LER - lesão por esforços repetitivos e a depressão, enquadradas como acidentes do trabalho.
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Em Blumenau, em 2010, haviam 119,5 mil trabalhadores no mercado formal de trabalho, sendo o maior número da indústria têxtil e do vestuário (64%). Dados apurados entre 2005 a 2010 mostram que nesse período foram registrados no Centro de Referência em Saúde do Trabalhador - CEREST, 31.682 atendimentos cadastrados como acidentes de trabalho, sendo 10.533(33%) de mulheres e 21.091(67%) de homens (proporção de 2 x 1). Do total, 54% dos acidentes registrados no CEREST acontecem nos dois primeiros anos de contrato de trabalho, e 16% nos três primeiros meses de contrato.
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A análise dos dados recolhidos no INSS, no mesmo período, revela que, em média, 10% dos trabalhadores com emprego formal, em Blumenau, são afastados todos os anos devido à incapacidade para o trabalho, o que por si só exige uma atenção especial no sentido de apurar causas e propor soluções preventivas. O mais grave é que nem sempre as doenças ocupacionais são enquadradas como acidentes de trabalho, gerando subnotificação. Esse é o fenômeno que motivou a criação, em 2007, do Nexo Técnico Epidemiológico (NTEp) pelo Ministério da Previdência Social, um sistema que inverte o ônus da prova, gerando às empresas a responsabilidade de contestar casos enquadrados como acidentes do trabalho pelo INSS.
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O Controle Social é uma via privilegiada no acompanhamento e fiscalização da execução das políticas públicas. No âmbito da seguridade social, donde emanam as ações de saúde e previdência, o espaço de participação social está previsto na Constituição Federal, art. 194, VII. A análise das atas do Conselho Municipal de Saúde, no período de 2005 a 2010 e no cotejamento com a Constituição Federal e Lei 8.080/90 (Lei do SUS), porém, revela uma tímida participação social no controle destas políticas públicas. Não houveram discussões sobre avaliação do impacto que as tecnologias provocam à saúde, sobre os riscos de acidentes de trabalho, doença profissional e do trabalho, bem como os resultados de fiscalizações, avaliações ambientais e exames de saúde, de admissão, periódicos e de demissão, respeitados os preceitos da ética profissional, constatamos poucas informações aos trabalhadores e às suas respectivas entidades sindicais e às empresas.
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Não há uma listagem oficial de doenças originadas no processo de trabalho, que deveria ter, na sua elaboração, a colaboração das entidades sindicais, conforme preconiza a Lei 8080/90. Encontramos muita dificuldade no desenvolvimento da pesquisa com relação à totalidade dos sindicatos procurados, pois nem todos entregaram os documentos solicitados (convenções coletivas de trabalho, acordos coletivos, atas de reuniões, atas de assembléias, jornais sindicais, relatórios internos e externos, minutas de programas de rádio, CAT - comunicações de acidentes de trabalho, etc.). Entretanto, dentre os documentos entregues para análise, chamaram a atenção na pesquisa as cláusulas de convenção coletiva apresentadas por alguns sindicatos. Tratam-se de convenções vigentes nos períodos compreendidos no recorte da pesquisa (2005-2010) e muitas delas, trazem acordos tímidos no avanço dos direitos à saúde do trabalhador, chegando inclusive a meramente repetir disposições já previstas na Consolidação das Leis do Trabalho, na Lei do SUS ou mesmo na Constituição Federal.
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Outra cláusula bastante recorrente que foi verificada nas convenções coletivas, diz respeito aos atestados médicos e odontológicos e representa flagrante transigência sobre direito fundamental do trabalhador, uma vez que negociam o direito de escolha deste trabalhador por seu médico ou dentista de confiança, vinculando a validade dos atestados dos profissionais ao credenciamento dos mesmos à empresa ou ao sindicato da categoria. A Convenção Coletiva dos Têxteis de Blumenau é um exemplo. (Artigo analisando o assunto encontra-se disponível este link).
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Desta forma, o primeiro passo no planejamento de estratégias de prevenção em saúde do trabalhador consiste em ter um diagnóstico preciso dos principais problemas relacionados ao tema, compreendendo as principais vulnerabilidades da política. A prevenção em saúde do trabalhador não somente produziria imensa economia aos cofres públicos, como causaria impacto imediato e profundo na qualidade de vida de cada trabalhador e trabalhadora.
Nesta página, você pode acessar alguns artigos e arquivos resultantes de nossa pesquisa onde encontrará o detalhamento das informações acima expostas
(*) Elsa Cristine Bevian, advogada em Blumenau e professora de direito do trabalho na FURB
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