SAÚDE DO TRABALHO
Em debate, médica critica empresas 'verdes por fora e cinzentas por dentro'
Foto: Maria Maeno
Pesquisadora da Fundacentro lembra que muitas companhias já foram condenadas por expor trabalhadores a condições inadequadas
publicado 11/12/2013 17:46, última modificação 11/12/2013 19:05
São
Paulo – Em conferência sobre saúde do trabalhador, hoje (11), a médica
do Trabalho Maria Maeno, pesquisadora da Fundacentro (fundação vinculada
ao Ministério do Trabalho e Emprego), afirmou que o desenvolvimento
sustentável é um termo muito usado pelas empresas para valorizar a sua
imagem, mas algumas delas "são verde por fora e cinzenta por dentro".
Ela lembrou que Santander, Perdigão, Sadia, Walmart, Petrobras, Itaú,
entre outras companhias, já foram condenadas a partir de diferentes
ações do Ministério Público do Trabalho (MPT), por demissões de
trabalhadores adoecidos, exposição de trabalhadores a substâncias
tóxicas e desrespeito a pausas mínimas de trabalho, entre outros
problemas.
"São grandes
empresas que se dizem sustentáveis e com responsabilidade corporativa,
que plantam árvores, mas sabemos que isso não e bem assim. Eles não
contam a quantidade de lixo que produzem nem como tratam a saúde de seus
trabalhadores", disse a médica, durante a 1ª Conferência Estadual de
Saúde do Trabalhador, organizada pela CUT paulista. O evento, que vai
até amanhã, visa a sistematizar propostas para serem encaminhadas à
conferência nacional, prevista para novembro do ano que vem.
Para
Maria Maeno, é necessário criar uma relação entre a saúde do
trabalhador e o meio ambiente, como movimentos históricos, com
perspectivas diferentes e pontos em comum. "Quando discutimos o Brasil
funcionando 24 horas por dia, discutimos o mundo do consumo e países que
optaram por esse modelo econômico. Mas não podemos esquecer que isso
significa mais trabalhadores em ciclos nocivos à sua saúde e mais lixo
no meio ambiente. Quando falamos em rios poluídos, devemos falar também
da forma de coleta que temos e das condições de trabalho que isso
envolve."
Ela destaca que
a abordagem das empresas está sempre direcionada ao indivíduo. "Se ele
sofreu um acidente, é porque não prestou atenção. A utilização que as
empresas fazem para culpar o trabalhador pelo seu acidente é
generalizada. São inúmeras as doenças hoje provocadas pelo trabalho, o
que só aumenta o ônus para toda a sociedade."
Segundo
dados do Ministério da Previdência Social, em 2012 o Brasil teve mais
de 700 mil acidentes de trabalho. Em São Paulo, foram cerca de 245 mil –
destes, cerca de 40 mil referem-se à denúncias feitas por sindicatos ou
outras fontes, excluídas as empresas. Do total de acidentes no ano
passado no estado, 53% atingiram trabalhadores de 19 a 34 anos. Em
média, 18 empregados por dia não retornaram ao trabalho, por invalidez
ou morte.
"O mundo do
trabalho é cruel. O recurso financeiro, em vez de ser gasto com saúde e
prevenção, está sendo utilizado para doença, invalidez e acidentes.
Temos de nos organizar e mudar essa lógica, porque ao capital não
interessa fazer essa mudança”, afirma a secretária da Mulher
Trabalhadora da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Seguridade
Social (CNTSS), Maria Godói.
Para
ela, o debate sobre as condições de saúde deve ser feito em conjunto
com outros relacionados ao mundo do trabalho. Terceirização,
competitividade, pressão pelo cumprimento de metas, rotatividade,
pessoas expostas a ritmo acelerado, instabilidade e ameaça de desemprego
estão diretamente interligados à saúde.
"Para
propiciar um mundo de trabalho competitivo, tudo gira em torno de valor
financeiro e não humano. Isso cria um sentimento de vulnerabilidade que
reflete na vida social dos trabalhadores, com aumento das doenças
ocupacionais, hipertensão, assédio moral, distúrbios mentais, estresse,
doenças respiratórias", afirma a sindicalista. "A saúde não pode ser
isolada do resto. Sabemos do enfrentamento que temos de fazer nas
inúmeras áreas, porque a meta do capital não é a nossa, ela não observa a
vida."
Discussões sobre
nanotecnologia também fizeram parte da conferência. Segundo alguns dos
participantes, a nanotecnologia vem ganhando espaço nas mesas de
negociações. A manipulação da matéria em escalas muito pequenas ainda
tem efeitos pouco conhecidos por parte de trabalhadores e patrões.
"Se
tivermos de pensar numa escala, podemos imaginar o nanômetro como um
grão de areia, localizado entre Salvador e Natal, na distância de 1.126
quilômetros entre estas duas cidades”, afirma o técnico do Dieese Thomas
Ferreira Jensen. "O mesmo material considerado seguro na escala maior,
na escala nanopartícula pode entrar na pele, ou se tornar aerosol e
entrar no organismo via respiratória."
Segundo
o Dieese, no Brasil existem cerca de 150 empresas envolvidas com
projetos de desenvolvimentos de produtos em nanotecnologia, interagindo
com setor acadêmico, com destaque para as petroquímicas e
cosméticos. Desde 2008, os trabalhadores do ramo químico discutem em
negociação coletiva os riscos que envolvem a nanotecnologia e tentam
inserir cláusula em convenção, mas enfrentam resistência do lado
patronal. Em abril do ano passado, o setor farmacêutico foi o primeiro a
aceitar a inclusão do tema em acordo, como recomendação para as
Comissões Internas de Prevenção de Acidentes (Cipas) abordarem com os
trabalhadores os riscos existentes e medidas de proteção.
"A
incorporação do progresso técnico tanto pode ser benéfica como danosa.
Ainda não há estudos confiáveis para avaliar os riscos da nanotecnologia
na saúde do trabalhador, mas é necessário incorporar essas tecnologias a
um processo seguro", afirma Jensen. As negociações e estudos em torno
de nanotecnologias envolvem as assessorias do Dieese, Departamento
Intersindical de Estudos e Pesquisas de Saúde e dos Ambientes de
Trabalho (Diesat), Fundacentro e sindicatos.
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