Homenagem a Jango constrange general
Comandante militar do Sul, Carlos Goellner, diz que Exército não deve 'desculpas' e que não houve 'erro histórico'
Senador Simon afirma que golpe de 1964 foi um erro e cita anulação da sessão do Congresso que aceitou a deposição
FELIPE BÄCHTOLD DE PORTO ALEGRE
Com
manifestações populares e intensa mobilização política, os restos
mortais do presidente João Goulart (1919-1976) foram sepultados de novo
ontem no município de São Borja (RS), no dia em que a morte completou 37
anos.
O corpo havia sido exumado três semanas atrás e levado a Brasília para uma perícia e coleta de amostras.
A
série de homenagens de ontem foi marcada por uma declaração do
comandante militar do Sul, general Carlos Bolivar Goellner, que falou,
antes da chegada ao município do corpo do presidente deposto, que o
Exército não devia "desculpas" e que não houve um "erro histórico".
Jango
foi deposto em 1964. Morreu no exílio na Argentina e foi enterrado em
São Borja sem direito às honras de chefes de Estado: "A história não
comete erro. A história é a história. Estamos cumprindo um preceito
regulamentar, são honras previstas no regulamento", disse o general.
A
afirmação provocou reações de políticos que foram à cidade acompanhar o
enterro, como os senadores Pedro Simon (PMDB-RS) e Randolfe Rodrigues
(PSOL-AP).
Simon
disse que é preciso reconhecer que o golpe de 1964 foi um erro e citou a
recente anulação simbólica da sessão no Congresso que tirou Goulart da
Presidência.
A ministra
Maria do Rosário (Direitos Humanos), que diz ver a exumação como um
"resgate histórico", preferiu não comentar o assunto.
O
objetivo da exumação é verificar a causa da morte de Jango. Na época
foi divulgado que o presidente havia tido um infarto, mas familiares e o
governo suspeitam que ele tenha sido envenenado.
Ainda
não há um prazo para a divulgação da análise. Amostras coletadas no DF
foram encaminhadas para laboratórios fora do Brasil. Na chegada do caixão a São Borja, militares prestaram honras fúnebres. A prefeitura decretou feriado. Milhares de pessoas participaram das homenagens nas ruas e na igreja, onde foi feita missa em sua memória.
Na igreja, Simon disse em discurso que no primeiro enterro havia "ameaças" se surgissem manifestações de apoio a Jango: "O carro veio a 120 km/h de Uruguaiana a São Borja. Mas o povo estava por todas as ruas e o carro foi obrigado a parar". João Vicente Goulart, filho de Jango, chamou o momento de "segunda despedida" e afirmou que "quem oprimia" hoje está "calado".
Leia mais.
Bilhetes revelam que Dops forjou relatório sobre torturado em 71
Um dos papéis diz que 'cel. Gastão mandou acrescentar' que engenheiro reagiu à prisão
ITALO NOGUEIRA DO RIO
Bilhetes
escritos em papéis da direção do Departamento de Ordem Política e
Social da Guanabara revelam como foram incluídas informações falsas na
versão final do Exército sobre a prisão do engenheiro Raul Amaro Nin
Ferreira, morto após tortura durante a ditadura militar. Escritos a mão, eles pedem alterações no relatório final do órgão de repressão da ditadura sobre o caso.
Os documentos integram levantamento feito pelo arquiteto Felipe Nin, 27, o advogado Raul Nin, 31, e Marcelo Zelic, do Grupo Tortura Nunca Mais. Ele detalha os 12 dias de agosto de 1971 em que o engenheiro ficou preso antes de morrer após ser torturado.
Um bilhete diz: "Cavalheiro: cel. Gastão mandou acrescentar no episódio da prisão: ao ser capturado, reagiu à prisão'". Trata-se de pedido do então diretor do Dops, coronel Gastão Fernandez.
A inclusão do falso confronto é feita para justificar as marcas de agressão constatadas quando Raul Nin Ferreira foi internado no Hospital Central do Exército.
O falso confronto não constava no primeiro relatório sobre a sua prisão, feito pelo chefe de buscas ostensivas do Dops, Mario Borges. Passou a existir em documento difundido pelo CIE (Centro de Informações do Exército).
Na nova versão, Ferreira tentou fugir quando policiais vasculhavam sua casa.
"O guarda tentou impedir a fuga, ao que reagiu com agressividade violenta; ato contínuo, os demais policiais acorreram ao local, só conseguindo conter o subversivo após cerrada luta corporal."
A versão foi desmentida por foto tirada pelo Dops quando o engenheiro entrou na prisão. Nas imagens não há cenas de confronto.
Raul Ferreira foi preso em agosto de 1971 apontado pelo Serviço Nacional de Informações como membro do comando do MR-8, grupo que participou da luta armada contra a ditadura. A família diz que ele apenas fazia parte da rede de apoio do grupo.
Em outro bilhete, pede-se que inclua nos documentos a suposta colaboração por parte do pai de Ferreira na localização de sua residência. A família nega que o pai tenha dito isso. A suspeita é que isso foi feito para ocultar o verdadeiro informante.
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